JUE 28 DE MARZO DE 2024 - 16:00hs.
Opinião - Angelo Alberoni, fundador do Betzilian.com.br

Brasília pode complicar o futuro de uma lei de apostas com vários pontos confusos

“Assim que foi divulgada a tão comentada minuta do decreto de regulamentação para operar com apostas esportivas, o sinal de alerta dos operadores e do mercado em geral foi ligado”, afirma nesta coluna de opinião, Angelo Alberoni, fundador da Betzilian e sócio e chefe de operações da VX Comunicação Portugal. Segundo ele, são pelo menos cinco pontos controversos, mas, neste texto, o autor aborda apenas dois: impostos e abertura do mercado.

O Brasil não é para amadores e surpresas acontecem a cada dia. No âmbito das apostas esportivas de quota fixa e seu regulamento não poderia ser diferente.

Há duas semanas, o secretário nacional de Avaliação de Políticas Públicas, Planejamento, Energia e Loteria do Ministério da Economia, Alexandre Manuel da Silva, havia surpreendido o mercado com notícias interessantes sobre o futuro mercado brasileiro, ao adiantar alguns pontos do regulamento à Lei nº 13.756/18.

Porém, assim que foi divulgada a tão comentada minuta, o sinal de alerta dos operadores e do mercado em geral foi ligado. São pelo menos cinco pontos controversos (impostos, abertura do mercado, tipos penais, publicidade e autorizações), mas para que o artigo não fique tão longo, vou abordar apenas dois: impostos e abertura de mercado.

Vamos por pontos.

IMPOSTOS

Aqui reside a primeira confusão.

Inicialmente, a Lei nº 13.756/18 havia determinado que, no meio físico, 80% do produto (turnover) da loteria (apostas de quota fixa) no mínimo, para o pagamento de prêmios e o recolhimento do imposto de renda incidente sobre a premiação. Enquanto no meio online, esse percentual subiria para 89%.

Art. 30. O produto da arrecadação da loteria de apostas de quota fixa será destinado da seguinte forma:

I – em meio físico a) 80% (oitenta por cento), no mínimo, para o pagamento de prêmios e o recolhimento do imposto de renda incidente sobre a premiação

f) 14% (quatorze por cento), no máximo, para a cobertura de despesas de custeio e manutenção do agente operador da loteria de apostas de quota fixa;

II – em meio virtual:

a) 89% (oitenta e nove por cento), no mínimo, para o pagamento de prêmios e o recolhimento do imposto de renda incidente sobre a premiação;

f) 8% (oito por cento), no máximo, para a cobertura de despesas de custeio e de manutenção do agente operador da loteria de apostas de quota fixa.

Para o operador, as margens de receitas, antes dos custos operacionais, seriam de 14% no meio físico e 8% no ambiente virtual.

Ora, se o modelo de tributação já estava descrito na Lei, como o Regulamento poderia alterar esses percentuais e estabelecer um novo critério? Além de redistribuir as fontes de receitas com o jogo por parte do Estado? Não pode.

Assim, o modelo de 99% da arrecadação “para cobertura das despesas de custeio e manutenção do agente operador da loteria e para premiação bruta” é algo que deverá ser novamente repassado no Poder Legislativo, uma vez que o Decreto não pode alterar o texto Legal.

Quando o Secretário vem à público pedir que nossos legisladores alterem uma Lei que mal foi publicada e que precisa de um Regulamento para que um de seus artigos tenham eficácia, é preciso entender que o jogo apenas começou. Daí é preciso ler nas entrelinhas de Brasília.

Nos últimos meses, muitos agentes políticos brasileiros vêm atuando de forma ativa para reabrir a discussão sobre as apostas esportivas no país em seus redutos, uma vez que o Poder de regulamentar o artigo 29 da Lei conferiu autonomia quase que integral ao Ministério da Economia.

Um lapso que só foi percebido após sua publicação. Pelo menos no entendimento dos nossos políticos.

Pelo discurso em todos os eventos nos últimos meses, a discussão sobre o Regulamento deverá voltar às Casas Legislativas brasileiras, ao que parece, deverá atrasar ainda mais a transformação do Brasil em um mercado regulado para as apostas esportivas.

ABERTURA DO MERCADO

Outro ponto que causou confusão está no inciso III, do §1º, do art. 12 da Minuta, onde determina que para atuação no Brasil a empresa interessada deverá juntar uma declaração de que nunca operou de forma ilegal em um mercado regulado. Ora, e as empresas que hoje “atuam” no Brasil, como ficam?

Caso o artigo seja levado à risca, muitos players que apostaram no Brasil ainda como gray market (ocorre quando alguns produtos são vendidos através de canais de distribuição sem autorização legal) deverão fechar suas portas e arcar com as penalidades dispostas no Regulamento, inclusive com a impossibilidade em atuar no mercado que ajudaram a desenvolver e foram as desbravadoras. Junto com a questão dos impostos, esse ponto precisa ser melhor explicado pela Secretaria.

Aliás, é preciso ir além do texto legal e estabelecer uma posição sobre as operações em andamento no país, pois muitos destes operadores possibilitaram que o Brasil tenha criado, ainda que de forma pequena, uma cultura própria relacionada às apostas esportivas capaz de pressionar o Estado a buscar sua legalização. Quarentena, blackout, perdão, etc. Até a abertura do mercado, após o cumprimento das condicionantes do artigo 53 e seus incisos, não ficou claro como ficará o cenário brasileiro, o qual já movimenta alguns milhões de Reais e gera um número crescente de empregos indiretos.

O ideal será uma flexibilidade na hora de exigir algumas das declarações citadas no Regulamento, principalmente para as empresas que já estão no país e apostaram no Brasil quando o Mundo sequer tinha olhos para o povo tupiniquim.

A interpretação deverá ser ampla e não restritiva.

BRASÍLIA NÃO DORME NO PONTO

Existem outros tantos pontos pouco esclarecidos na Minuta do Decreto regulamentar das apostas esportivas no Brasil e que, sem dúvida, serão alvo de novos posts por aqui, mas estes dois pontos foram os que mais chamaram a atenção de forma inicial.

Com essa confusão entre Lei e Decreto, além do pedido expresso do Secretário para que a discussão tenha uma nova rodada de análises nas Casas Legislativas, é possível ler nas entrelinhas que Brasília não dorme no ponto.

O Regulamento poderá sair até dezembro? Pode. Sairá completo? Tenho minhas dúvidas, afinal, se for preciso rever a Lei, com a quantidade de matérias importantes na pauta do Congresso, dificilmente teremos um artigo 29 da Lei nº 13.756/18 reformulado antes de 2020.

Enfim, é apenas uma opinião acerca de uma Minuta. Então vamos torcer para que tudo isso não passe de um devaneio ou mais uma teoria da conspiração.

Ângelo Alberoni

Ângelo Alberoni é o fundador do Betzilian.com.br, sócio e chefe de operações da VX Comunicação Portugal. É também diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira - CCILB. Alberoni, além de publicitário, é advogado e atua no mercado de apostas esportivas online desde 2010.