JUE 18 DE ABRIL DE 2024 - 00:22hs.
Roberto Tavares, trader esportivo

"Quando se fala de legislação de apostas, o exemplo mais próximo da perfeição é o da Inglaterra”

Roberto Tavares é trader esportivo há sete anos, é sócio do Clube da Aposta e um dos membros fundadores da ABAESP (Associação Brasileira de Apostas Esportivas). Nessa entrevista exclusiva dada ao GMB, ele fala sobre a criação de escolas de apostas no Brasil, o que deveria mudar na minuta apresentada pela SECAP e como vê a indústria de jogos após a pandemia. 'A tendência é que dentro de alguns anos os esportes virtuais movimentarão tanto dinheiro quanto os físicos”, acredita Tavares.

GMB - Você é Trader desde 2013. Se tornar profissional antes da popularização das apostas no Brasil é algo que te coloca em vantagem no mercado? O que foi preciso para conseguir chegar no patamar de Trader?
Roberto Tavares -
Na época em que comecei a me dedicar ao trading esportivo haviam poucas informações sobre as boas práticas e formas de trabalho profissional. O mercado que hoje dá sinais de ser mais justo e maduro, naquele momento era suscetível a erros que ocasionavam oportunidades aos que detinham algum nível de conhecimento, mesmo que baixo se comparado aos dias atuais.

Ter começado naquela época me permitiu evoluir junto com o mercado, e quanto mais experiência acumulada, mais fácil é a adaptação a novos cenários. Já foram milhares de partidas trabalhadas, e o conhecimento teórico e prático adquirido nesses 7 anos me dão alguma vantagem frente aos que ainda buscam métodos de trading. Para chegar na posição em que estou hoje foi preciso primeiro entender que o que eu faço não é nada diferente de qualquer outro trabalho. Foi preciso assimilar qual era a minha função, e como executar as minhas estratégias de maneira prática, sem subjetividade. Além disso, tirar completamente da cabeça a ideia de ficar rico facilmente e aprender a lidar com as nuances de um trabalho de remuneração variável.

Está tendo um boom no Brasil de escolas para profissionalizar apostadores esportivos. Como ainda é um ramo novo no país, como os possíveis alunos podem analisar para escolher a escola certa para eles? Quais características essas instituições precisam ter para mostrar que são as melhores e que possuem um diferencial?
O primeiro fator - e talvez o mais importante - é perceber se há ou não promessa de lucratividade. Sou categórico neste ponto: não há como garantir renda. Qualquer pessoa ou empresa que prometa lucros não é digna de confiança. Outro fator importantíssimo é buscar informações sobre o profissional, ou a empresa que fornece conteúdo. Infelizmente, muitos dos que promovem treinamentos sequer são apostadores ou traders, apenas fazem um bom marketing e vendem a ideia de ganhar dinheiro apostando, ou investindo em partidas de futebol e de outros esportes. Os que não merecem confiança geralmente têm vida curta, e por mais que consigam fazer barulho no começo, não costumam sobreviver por mais de um ou dois anos. A título de exemplo, o Clube da Aposta – empresa que sou sócio e que disponibiliza uma série de treinamentos grátis e pagos – já está no ar há 10 anos.

Recomendo que antes de começar seja feita uma boa pesquisa. Tudo está disponível na internet. Um dos nossos alunos portugueses do treinamento avançado de trading disse recentemente uma frase que serve perfeitamente para finalizar esta questão: todos os dias saem à rua um espertalhão e um inocente. Sempre que eles se encontram, sai negócio. Não seja inocente, nem tente ser espertalhão.

Como você vê esse cenário após a regulamentação das apostas? Estará em crescente popularização dessas escolas profissionalizantes?
Tudo depende, na minha visão, das regras que serão estipuladas, tanto para os apostadores e traders quanto para as casas de apostas. Enquanto não houver uma definição, certamente o mercado seguirá em alta. Após a regulamentação, pode haver um novo “boom”, ou andarmos alguns passos para trás. Quanto mais livre for o mercado, maiores serão as ofertas e melhor será o desenvolvimento de plataformas sérias como o Clube da Aposta. Já em um cenário restrito e altamente regulado, deverão haver poucas ofertas, o que penaliza o investidor profissional e minimiza a possibilidade de gerar renda com as apostas. Neste último caso, só será favorecido o produtor que promete “ganhos fáceis do sofá de casa”, e assim o número de “escolas” pode aumentar, mas a qualidade deve cair drasticamente.

Você analisou a minuta divulgada pela SECAP para consulta? O que adicionaria ou mudaria na minuta para que todos saíssem ganhando, tanto Estado quanto operadores e apostadores?
Sou um dos membros fundadores da ABAESP (Associação Brasileira de Apostas Esportivas) e o documento foi analisado em conjunto com alguns dos maiores e melhores apostadores e traders do país. Os pontos mais controversos são a limitação do número de operadores em território nacional em modelo de licitação, a equiparação das apostas de quota fixa à loterias e também a forma de tributação sugerida. Em relação à tributação, a proposta é que seja aplicada sobre o Turnover (soma de todo o montante financeiro negociado) ao invés do GGR (lucro bruto das operações), o que é completamente equivocado e torna o cenário inadequado e inviável para os operadores, o que fomenta o jogo ilegal. Da mesma forma, a equiparação das apostas esportivas – denominadas apostas de quota fixa – com as loterias, é igualmente descabida pois são atividades completamente distintas e precisam ser tratadas de maneira específica. Os pontos citados já se mostraram ineficientes e fracassaram em todas as tentativas em outros países.

Diante da realidade vivida por muitos países em relação à regulamentação das apostas, qual seria o país modelo, no qual o Brasil pudesse se espelhar na hora da criação de uma regulação justa para todos? Por quê?
Somos inexperientes, e nada melhor do que consultarmos os países mais desenvolvidos e aplicar o que já funciona por lá. Quando se fala de legislação, o exemplo mais próximo da perfeição é o adotado pela Inglaterra. O estado fatura alto, os operadores têm um livre mercado para se desenvolver, além de gerar emprego e renda, e os apostadores têm uma série de opções com ofertas justas, além da proteção ao jogador que eventualmente tiver problemas com as apostas. É preciso ter um ambiente propício e seguro para todas as partes envolvidas, e os ingleses são mestres nisso. Entretanto, o Brasil parece preferir consultar países inexperientes, que num curto espaço de tempo aprovaram leis que são um fracasso e fomentam o jogo ilegal, como é o caso – lamentavelmente – de Portugal.

Diante do seu conhecimento sobre essa segmentação, como acredita que as apostas esportivas podem beneficiar o Brasil?
Para o governo o benefício é óbvio, pois num mercado regulado haverá tributação e arrecadação de impostos. Havendo mais arrecadação, mais recursos o país terá para se desenvolver e toda a população pode ser beneficiada. Para nós, traders e apostadores, trabalhar em um mercado regulado – de forma justa –  é sinônimo de segurança e estabilidade. Já para os operadores, um livre mercado, com regras claras e objetivas, obedecendo as melhores práticas mundiais, oferece um ambiente propício para o investimento. No melhor dos cenários – aquele mais semelhante ao Inglês – todos saem ganhando. No pior, semelhante à Portugal, todos são prejudicados, inclusive o próprio governo.

Qual seu posicionamento em relação à publicidade de casa de apostas? Será um grande investimento no esporte brasileiro?
Seguramente todo o país pode se beneficiar de um mercado regulado e aberto. Clubes, fornecedores, torcedores, apostadores, veículos de imprensa e vários outros setores podem passar a gerar mais receita, o que ajuda a nação como um todo. O ponto mais controverso da legalização e da publicidade é a proteção ao jogador e aos casos de ludopatia. A legalização, ao contrário do que muitos pregam, protege o apostador e dá luz ao problema que hoje já existe, mas que o estado esconde num canto escuro de uma sala. Adotando boas práticas, é possível detectar pessoas problemáticas e direcioná-las a tratamentos adequados.  Sendo assim, só existem benefícios quando o tema é publicidade de casas de apostas.

Durante essa pandemia mundial, como vê a situação do apostador profissional e das casas de apostas? Foi possível os apostadores se reinventarem dentro do jogo assim como os operadores fizeram para continuar oferecendo apostas aos seus usuários?
Passamos por uma situação semelhante à da maioria dos brasileiros. Apostadores profissionais costumam se especializar em ligas e campeonatos, e a maioria utilizou o tempo livre para estudar e avaliar o próprio desempenho. Algumas formas de trabalho são compatíveis com a maioria das ligas, outras são singulares e precisam ser aplicadas em situações igualmente específicas. No meu caso, não houve um investimento sequer até o retorno de Bundesliga 1 e 2. Para as casas, foi um período financeiro catastrófico, mas nada diferente do cenário mundial e tampouco comparável ao sofrimento de quem foi afetado pela COVID-19. As empresas se reinventam, os traders e apostadores se adaptam. É preciso que todos tenham uma compreensão da magnitude do que estamos vivendo e que consigam olhar pra frente.

Por fim, como acredita que será o cenário das apostas esportivas após a pandemia? Acredita que o eSports, por exemplo, veio para ficar?
O cenário pós-pandemia me preocupa um pouco, pois algumas pessoas tentarão ingressar neste mundo acreditando ser a salvação de todos os problemas. De fato, é possível se tornar um profissional e viver das apostas, mas não é simples como muitos pregam. Tanto o trading como o punting exigem estudo, dedicação, comprometimento, experiência e conhecimento, assim como qualquer outra atividade. Torço para que essas pessoas encontrem fonte de informação confiável e honesta.

Em relação aos eSports, a pandemia deu vida a algo que já estava se tornando evidente nos últimos tempos. Apesar de ainda embrionário no mundo das apostas, os eSports carregam uma legião de fãs e entusiastas, pessoas que são ligadas à tecnologia e com fácil acesso aos meios digitais, que certamente não terão dificuldade em apostar em eventos que acompanham. A tendência, na minha opinião, é que dentro de alguns anos os esportes virtuais movimentarão tanto dinheiro quanto os físicos.

Fonte: Exclusivo GMB