SÁB 20 DE ABRIL DE 2024 - 07:03hs.
Anna Florença Anastasia, advogada

Falta de regulação das apostas esportivas resulta em grande prejuízo à administração e à sociedade

O crescimento das apostas esportivas, especialmente às vésperas da Copa do Mundo, é inegável, mas na avaliação da advogada Anna Florença Anastasia para o Poder360, a grande prejudicada é a coletividade, já que “inexistente a regulamentação das apostas de quota fixa, o governo nada arrecada com essa atividade e os repasses não ocorrem, resultando em mais um grande prejuízo à administração pública e à sociedade”.

Muito embora o ano de 2022 tenha sido movimentado no cenário das loterias estaduais, o Brasil perdeu a oportunidade de regulamentar as apostas de quota fixa a tempo do início da Copa do Mundo no Qatar. Nesse tipo de aposta, o apostador sabe de antemão quanto irá receber caso acerte o prognóstico.

A despeito da Lei nº 13.756 de 2018, editada pelo então presidente da República, Michel Temer (MDB), determinar a regulamentação de tal modalidade pelo Ministério da Fazenda, em um prazo de 2 anos —que, aliás, já expirou—, pouco se fez para que o serviço pudesse ser explorado oficialmente no país, e, quanto a isto, o prejuízo é grande.

A maior prejudicada é, fatalmente, a coletividade. Pois, o produto da arrecadação da exploração das apostas de quota fixa, em âmbito federal, deveria ser destinado à seguridade social, à cultura, à manutenção da segurança pública e ao esporte, conforme disposição dos arts. 15 a 17, da Lei nº 13.756 de 2018.

No entanto, inexistente a regulamentação das apostas de quota fixa, o governo nada arrecada com essa atividade e os repasses não ocorrem, resultando em mais um grande prejuízo à administração pública e à sociedade.

Não fosse o bastante, no que tange à questão mercadológica, o Brasil deixa de auferir benefícios em relação a esse setor, uma vez que as grandes empresas de apostas operam normalmente no país, sem, no entanto, hospedar no Brasil seus sítios eletrônicos ou manter aqui qualquer sede ou filial. Estas mesmas empresas, hoje, já patrocinam grandes times de elite do futebol brasileiro, além de veicular na televisão –em canais abertos, inclusive– propagandas de seus serviços.

Observe-se como é enorme o prejuízo:  as empresas do setor vêm operando normalmente, sem regulamentação, e, como atuam a partir do exterior, deixam de criar empregos (em um país onde o desemprego é a realidade de 9 milhões de pessoas) e de recolher impostos nas esferas municipal, estadual e federal. Além de também ficarem sem pagar os devidos impostos aqueles apostadores que auferem prêmios nas apostas esportivas.

Mais uma vez a maior prejudicada é a coletividade, na medida em que a arrecadação de impostos é essencial às melhorias e ao funcionamento eficiente dos serviços públicos ofertados à população.

O que chama mais a atenção em meio a este contexto é o fato de o Brasil ser o 3º país que mais aposta em eSports, ficando atrás só dos Estados Unidos e da China. Ou seja, a movimentação de valores neste segmento não só é relevante, como de grande volume.

Os dados não deixam dúvidas: o setor movimentou, no Brasil, R$7 bilhões em 2020. Em 2023, este número pode chegar a R$12 bilhões, segundo projeções. Mas tudo isto depende de um movimento consistente para que as apostas de quota fixa sejam regulamentadas o mais breve possível.

O volume das apostas esportivas durante a Copa do Mundo certamente será surpreendente, sobretudo se comparado com a Copa do Mundo de 2018, que movimentou no setor o montante de € 136 bilhões, segundo a Fifa. E, neste ano, vê-se que o movimento está em todo lugar. Nos últimos dias, revistas renomadas já veicularam informações de sites de apostas e guias para participação em “bolões”.

Espera-se que eventos como as últimas eleições presidenciais e, agora, a Copa do Mundo sirvam de lição, e que o Brasil não deixe passar mais oportunidades de crescimento e arrecadação, e passe a enxergar o mercado de apostas como um aliado da economia e da sociedade como um todo.

Anna Florença Anastasia
Advogada administrativista no GVM Advogados, com atuação voltada sobretudo para o Direito dos Jogos. Graduada em Direito pela Escola Superior Dom Helder Câmara e pós-graduanda em contratos e licitações pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Fonte: Poder360