DOM 19 DE MAYO DE 2024 - 05:33hs.
Udo Seckelmann, advogado

Como trazer uma operação de apostas esportivas para o Brasil

Com uma população de 210 milhões de habitantes com uma propensão considerável para o jogo e uma enorme cultura esportiva, muitos operadores internacionais estão olhando o mercado brasileiro como uma grande oportunidade de lucro. No entanto, trazer uma operação de apostas esportivas para o Brasil não é tão simples quanto se imagina. Neste artigo, Udo Seckelmann, advogado do Bichara e Motta Advogados, fará uma breve análise dos principais aspectos que os operadores internacionais devem estar atentos antes de vir ao Brasil.

1. Entendendo a situação legal dos jogos de azar

No Brasil, cassinos e casas de apostas são proibidos desde a década de 1940, mas o ato de fazer uma aposta esportiva tem um curioso status legal. Embora nossa legislação de 1940 proibisse o estabelecimento de estruturas terrestres para exploração de jogos de azar em território brasileiro, a evolução subsequente da internet abriu uma brecha legal para as empresas estrangeiras de apostas online operarem em uma “área cinza” não regulamentada.

Depois de décadas tolerando essa brecha legal, o Brasil finalmente está pronto para regular todo o seu mercado de apostas esportivas. Lei Federal nº. 13.756 de dezembro de 2018 regulamenta principalmente a loteria nacional brasileira, mas também inclui disposições para regular as apostas esportivas (uma categoria definida como “apostas de probabilidades fixas relacionadas a eventos esportivos”) e sua alocação de receita tributária relacionada. De acordo com o artigo 29 da Lei, a categoria “apostas de cotas fixas” será um serviço público, podendo o Governo Federal emitir licenças para operadores comerciais, tanto online quanto em estruturas terrestres.

O Ministério da Economia do Brasil agora tem dois anos – prorrogáveis ​​por mais dois – para desenvolver regulamentos adequados para o setor. Assim, a expectativa do setor é que o marco regulatório esteja em vigor até o final de 2022.

Diante dessa transição legal, as casas de apostas estão atentas e já se posicionam para investir no país. Enquanto algumas operadoras se sentem à vontade para fazer apostas e aproveitar o “mercado cinza” brasileiro, algumas aguardam ansiosamente a regulamentação do setor antes de agir.

2. Tropicalize sua operação

Independentemente de ser turnkey ou white label, muitos operadores assumem que a simples tradução de seu site para o português seria suficiente para trazer sua operação para o Brasil, mas não é bem assim.

O público brasileiro é completamente diferente de outros mercados, ainda que o comparemos com outros países da América do Sul – muito menos europeus e asiáticos. O operador estrangeiro tem que adequar sua operação ao Brasil, ou seja, “tropicalizar sua operação”.

“O que o apostador brasileiro quer?”

Essa é a principal pergunta a ser feita; e a resposta precisa só será dada por profissionais locais especializados da área. Dois exemplos claros dessa cultura em particular são o boleto bancário e o PIX (método de pagamento criado pelo Banco Central do Brasil para transferências bancárias diretas instantâneas), que são métodos de pagamento muito comuns (e indispensáveis) usados ​​pelos apostadores depositarem dinheiro na plataforma de apostas. A ausência de tais opções certamente afastaria os apostadores da casa de apostas.

Trazer uma operação para o Brasil consiste em várias etapas, que variam de acordo com o investimento que a empresa está disposta a fazer. Além de um claro entendimento da complexa situação legal dos jogos de azar, projetar um site voltado para o público brasileiro, contratar uma empresa de meios de pagamento sólida e segura, contratar um departamento de TI para manter tudo junto e desenvolver estratégias de marketing (como afiliação, mídias sociais e até patrocínio de clubes) para alcançar com sucesso os apostadores brasileiros são alguns dos muitos passos ao longo do caminho.

Por isso, é muito importante que as operadoras estrangeiras tenham conexões no Brasil, principalmente com quem conhece o mercado de dentro, acompanhe de perto o processo regulatório e tenha parcerias estratégicas capazes de fornecer à operadora um roteiro do caminho de negócios que a operadora tem que seguir no Brasil.

3. Consolidação da marca

Após observar devidamente os dois aspectos anteriores, é hora de consolidar a marca da operadora em território brasileiro. Conquistar a confiança do público brasileiro certamente não é uma tarefa fácil, mas de fato é muito gratificante.

Para uma operadora, a proximidade com seu público-alvo no dia a dia gera confiança para quem deseja apostar em esportes, o que, por sua vez, deixa os apostadores à vontade para depositar dinheiro em sua plataforma.

Essa reputação certamente será útil quando o marco regulatório for editado pelo Ministério da Economia, principalmente porque existe a possibilidade de o Brasil limitar o número de licenças a serem concedidas às operadoras.

Assim, ao firmar sua marca e conquistar a confiança do público brasileiro, as operadoras terão maiores chances de obter uma licença quando o marco regulatório for editado pelo Ministério da Economia. “Primeiro a chegar, primeiro a ser servido”, você pode dizer.

Conclusão

O mercado global de apostas esportivas está crescendo exponencialmente e as operadoras estão agora atentas aos desenvolvimentos no Brasil, devido ao seu considerável potencial de investimento.

Um relatório encomendado pela Remote Gaming Association (RGA) e conduzido pela KPMG no final de 2017 estimou que o mercado cinza on-line offshore vale US$ 2,1 bilhões anualmente em termos de GGR (Gross Gaming Revenue). Um relatório recente da GamblingCompliance estimou que um mercado brasileiro maduro de apostas online e físicas poderia gerar uma receita bruta anual de US$ 1 bilhão para o país, sujeito à introdução de um regime de licenciamento competitivo para apostas online.

Com todas essas estatísticas em mente, as casas de apostas naturalmente estudam suas possibilidades de trazer sua operação para o Brasil. Seja para começar a explorar o atual “mercado cinza” imediatamente ou aguardar o marco regulatório antes de estabelecer seus negócios no Brasil, o fato é que ficar parado certamente resultará em uma oportunidade perdida.

Udo Seckelmann
Advogado do Bichara e Motta Advogados. LLM em Direito Desportivo Internacional no Instituto de Derecho y Economía (ISDE) em Madrid, Espanha. Editor e redator do Lex Sportiva, blog internacional sobre Direito Desportivo. Membro da Academia Nacional de Direito Desportivo (ANDD) – Comissão da Juventude. Membro da Comissão de Direito Desportivo da OAB/Barra (RJ).