MAR 30 DE ABRIL DE 2024 - 21:47hs.
Análise profunda do GMB identifica repercussão negativa

Setor de apostas esportivas mostra-se decepcionado com regulação e vê dificuldades no futuro

Se por um lado a inclusão do cassino online foi uma boa notícia para os operadores de apostas esportivas, a manutenção da alta carga tributária e a redução do período de validade da outorga, que caiu de 5 para 3 anos, está provocando grande decepção dos sportsbooks, que veem grandes dificuldades no futuro a se manter o projeto aprovado na Câmara dos Deputados na última quarta-feira, 13. O GMB ouviu alguns players sobre o atual momento e suas perspectivas.

Poucos minutos após a aprovação do texto do relator Adolfo Viana (PSDB-BA), o presidente da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), Wesley Cardia, afirmou ao GMB que “o projeto em votação contraria as leis de mercado”. Para ele, impostos e outorgas mais altos “significam investimentos menores, menos apostas e, portanto, menor arrecadação pelo Estado”.

Mesmo decepcionado com o texto aprovado, Cardia afirmou que Adolfo Vianna, “muito inteligente, rapidamente percebeu que mais impostos significariam maior participação do jogo ilegal. Defendeu a lógica o quanto pode, mas foi vencido”.

Todo o setor faz coro com o dirigente e alguns empresários apontam que será muito difícil encontrar caminhos para a viabilidade econômica do segmento. “Será um desafio hercúleo para a atividade, já que terá de pagar à vista uma outorga de R$ 30 milhões para uma operação de apenas três anos e com uma carga tributária que irá ultrapassar os 30%”, afirmou o dirigente de uma casa de apostas que pediu para não ser identificado.

O segmento de apostas esportivas está decepcionado com o resultado das alterações que foram feitas no projeto de lei aprovado na última quarta-feira, 13. Além de não diminuir a carga tributária, como vinha sendo ventilado, houve a confirmação de que a outorga custará R$ 30 milhões e que valerá para apenas três anos, enquanto o setor esperava que o valor caísse pela metade ou que a outorga valesse por dez anos.

Há quase cinco anos esperando pela regulamentação e contribuindo com as discussões sobre a atividade, os principais players à frente dessa contribuição se sentiram frustrados com o substitutivo ao PL, elaborado pelo relator Adolfo Viana (PSDB-BA).

O setor foi pego de surpresa depois de ouvir falas do relator dizendo que estavam chegando a um consenso quanto à redução da carga tributária. Até mesmo José Francisco Manssur, assessor no Ministério da Fazenda responsável pelo processo de regulamentação, disse em uma audiência pública na Câmara dos Deputados que governo e relator tinham chegado a um acordo de “flexibilização muito importante do imposto, algo que irá tornar o mercado acessível”. No fim, a carga ficou nos mesmos 18%, já pesados para os operadores.

O Brasil, que vinha sendo apontado como um futuro gigante no setor de apostas esportivas com a regulamentação, passou a ser visto como o de maior carga tributária do mundo. Com a aplicação dos 18% sobre o GGR mais os outros impostos, o segmento arcará com algo entre 32% e 35%.

Reinventar a roda

Thomas Carvalhaes, diretor do Vaidebob, afirmou ao GMB que “a posição da indústria é unânime. Ninguém está feliz. É um retrocesso inédito reafirmando que o Brasil é o único país do mundo que considera aposta esportiva como uma loteria”.

Para ele, “é triste ver que os reguladores do Brasil preferem tentar reinventar a roda e cometer erros que outros mercados já cometeram. Tem de ser um ganha X ganha para todos e o Brasil caminha na contramão, fazendo tudo errado no que dizer respeito à viabilidade comercial de nossa indústria e com foco no quesito financeiro”.

 

 

O executivo do Vaidebob diz que “já não fazia sentido os cinco anos com GGR de 18% e agora o mesmo percentual e a diminuição do prazo tornaram a situação pior ainda. O retorno do investimento é impossível”, analisou.

Thomás destacou ainda a manutenção da taxação de 30% de imposto de renda para o apostador. “É mais uma prova de que estão impondo o foco da loteria ao apostador esportivo. É incabível e esperamos que isso mude no Senado e que eles tenham bom senso de rever o projeto aprovado pela Câmara. Não foi falta de posicionamento, pois a indústria sempre se mostrou colaborativa. Se esse cenário for mantido, o Brasil será o maior mercado negro do mundo”, avaliou.

Senado precisa mudar o projeto

Outro empresário do setor que manifestou descontentamento com o projeto na forma como foi aprovado pela Câmara dos Deputados foi Darwin Filho, CEO do Esportes da Sorte. Para ele, “há um sentimento unânime do setor da preocupação política e não econômica por parte do governo quanto à atividade”.

 

 

Esperamos sejam levados em consideração no Senado os aspectos técnicos bem compreendidos pelos integrantes do Ministério da Fazenda, sirvam para subsidiar as decisões no Senado para as mudanças necessárias para viabilizar uma atividade econômica que tem muito a contribuir para que o Brasil tenha uma regulamentação de sucesso de maneira a garantir recursos financeiros para o ente público e que permita a livre concorrência no setor privado”.

Segundo ele, é fundamental que o projeto seja alterado pelo Senado e que seja diminuída a carga tributária para que a atividade se torne mais atraente para os operadores de maneira a que se habilitem para o futuro mercado regulamentado no Brasil.

Tributação impactante e desproporcional

Luciana Macorin, head of legal da Salsa Technology, também analisou o atual momento do setor no Brasil e afirmou que “da forma como está o texto, praticamente inviabiliza operações em nível nacional e fortalece as iniciativas por parte das loterias estaduais”.

Segundo ela, “a tributação de 18% é impactante e desproporcional, bem acima de qualquer percentual aplicado pelo setor no restante do mundo, mas, infelizmente, o projeto manteve o histórico do Brasil de ser um país com impostos altíssimos”.

 

 

Outro ponto que ela destacou em concordância com outros players do mercado foi quanto à redução do prazo de outorga, “ainda mais prejudicial a qualquer possibilidade de sucesso. Os custos operacionais e de marketing são altos e é muito desafiante atingir o break even em um período tão curto, ainda mais com uma competição tão acirrada”.

Luciana apontou ainda a preocupação quanto à tributação do apostador. “Sabemos que, mesmo sem regulamentação, existem muitos operadores sérios, que atuam de forma responsável em várias frentes como proteção ao jogador, sistemas antifraude etc. A indústria vai seguir seu papel de destacar o que é importante para que os jogadores identifiquem operadores sérios. Os jogadores vão continuar escolhendo aquilo que é melhor para eles. Uma regulamentação que praticamente incentiva a resistência e o aumento do mercado não regulado não exatamente ajuda os jogadores a uma escolha segura”, destacou.

Ela espera por mudanças no projeto durante a tramitação no Senado. “Sabemos que entidades do setor já estão se movimentando no sentido de ampliar (mais uma vez) o debate. Estamos na torcida e mais que isso, dispostos a participarmos de forma ativa desse debate”, comprometeu-se a head of legal da Salsa Technology.

Prazo ínfimo

Diogo Souza, diretor de negócios da desenvolvedora de plataformas SGA, apontou que a inclusão no projeto aprovado de elementos técnicos referentes à realização de apostas, assim como questões ligadas à publicidade e propaganda, mecanismos de segurança e integridade das apostas, transações de pagamentos, “é um pouco demasiada, à primeira vista”. Para ele, entretanto, “é natural o estabelecimento de regras gerais para atuação de atividades antes não regulamentadas no país”.

Já quanto à questão tributária e de outorga, o executivo mostrou-se preocupado. “Infelizmente, não parece um cenário animador para a regularização do segmento, em especial para operadores de pequeno a médio porte”.

 

 

Para ele, a outorga de R$ 30 milhões, “terá como validade o prazo ínfimo de três anos. E vale lembrar que, além da carga de 18% sobre o produto da arrecadação dos operadores à União após a dedução do pagamento de prêmios e do imposto de renda incidente sobre a premiação (GGR), os operadores também teriam de custear a Taxa de Fiscalização pela exploração comercial da loteria de apostas de quota fixa, com valores apontados no anexo da Lei nº 13.756/2018, a tributação do regime adotado pela empresa, as licenças estaduais, a tributação ordinária de outros entes federativos, bem como outros custos intrínsecos ao desenvolvimento das operações”.

De qualquer maneira, Diogo espera mais debates sobre o tema. “É possível que surjam alterações no mencionado projeto. Espera-se que as novas deliberações sejam respaldadas com estudos reais quanto ao impacto que as obrigações pleiteadas teriam sobre os operadores do segmento, intentando, nesse sentido, o alcance de uma regularização factível aos custos das operações que impulsione a livre concorrência”.

Fatores desestimulantes

Luis Traversa, COO do Betmotion, outro importante player do mercado e um dos mais antigos sites de apostas em operação no Brasil, também se mostra apreensivo quanto à carga tributária definida no substitutivo aprovado.

A regulamentação das apostas esportivas no Brasil é um passo positivo, pois representa um avanço no reconhecimento da atividade. No entanto, com uma taxação de 18% sobre o GGR, somada a outros impostos, o custo total pode superar 25%. Isso pode tornar desafiador obter retorno sobre um investimento inicial de R$ 30 milhões. O ideal seria uma regulamentação que beneficie todas as partes envolvidas: o governo, com arrecadação adequada; o operador, com condições justas de lucratividade; e o jogador, com uma experiência de usuário satisfatória”.

 

 

Outro fator preocupante é o recolhimento de Imposto de Renda para os jogadores. “A taxação de 30% sobre os prêmios pode ser um fator desestimulante para muitos jogadores, especialmente quando consideramos que existem plataformas internacionais que não aplicam tal imposto”, lembrou o COO do Betmotion.

O jogador moderno está informado e busca as melhores condições para sua experiência de jogo. Caso se veja diante de uma taxação elevada, ele pode buscar alternativas, como utilizar VPN’s para acessar sites estrangeiros. É crucial oferecer um ambiente competitivo e atraente para reter o jogador dentro da legalidade”, alertou Traversa.

O executivo afirmou que embora não seja um especialista em política, “é minha esperança que o Senado considere ajustes que beneficiem o setor. Seria ideal que o prazo da licença fosse estendido para um período entre cinco e dez anos (preferencialmente 10 anos), com uma taxação total, incluindo impostos, que não ultrapasse os 18% - 20%. O equilíbrio entre arrecadação e sustentabilidade do negócio é fundamental para o sucesso a longo prazo das apostas esportivas no Brasil”.

Business plan

Carla Dualib, gerente regional de desenvolvimento de negócios da SOFTSWISS, entende que os critérios técnicos “nos parecem coerentes e alinhados com os aplicados em outras localidades”.

Uma de suas preocupações é quanto à taxação dos apostadores. “Em outros países, esses impostos são geralmente equivalentes a um imposto sobre ganhos de capital. Isso levanta a questão de quais áreas do Brasil ainda têm tributação dessa magnitude”, comentou para o GMB.

 

 

Além disso, Carla destacou a diminuição do período de licença para três anos. “Certamente o business plan dos operadores deverá passar por um bom exercício. Como mostra a prática, qualquer violação dos interesses dos jogadores leva a uma saída para zonas offshore. Atualmente existem muitas marcas que, por exemplo, utilizam a licença de Curaçao. E sim, pensamos que há caminhos para ser sustentável”, afirmou.

“Pensamos que ainda há margem para mudanças. Vamos aguardar. Estamos sempre prontos para auxiliar no que for preciso”, comprometeu-se a gerente regional de desenvolvimento de negócios da SOFTSWISS.

Fonte: GMB