SÁB 13 DE DICIEMBRE DE 2025 - 17:06hs.
Campanha inédita do IBJR

Dívidas no Brasil: estudo aponta peso alto dos juros e pouco efeito de apostas

Um novo estudo da LCA Consultoria Econômica, encomendado pelo Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR), revelou que o impacto das bets nas finanças das famílias brasileiras é mínimo. Embora cerca de 30% da renda familiar seja destinada ao pagamento de dívidas — sem considerar os custos de habitação —, as apostas esportivas representam menos de 0,5% desse total.

Segundo a análise, o setor não provocou uma crise de endividamento, correspondendo a apenas entre 0,2% e 0,5% do consumo das famílias e de 0,1% a 0,3% do PIB nacional.

As famílias brasileiras gastam em torno de 30% de suas rendas para pagar dívidas — e esse valor não considera os custos atuais de habitação. Qual o impacto das apostas esportivas nesse percentual? A LCA Consultoria Econômica produziu um levantamento que respondeu a essa pergunta: o impacto é de menos de 0,5%.

O que significa que a grande dificuldade dos cidadãos em reduzir o comprometimento da renda com dívidas se explica por outros fatores, como as altas taxas de juros cobradas pelos bancos, conforme afirma André Gelfi, diretor conselheiro e cofundador do IBJR. “O sistema financeiro formal cobra juros que chegam a 451% ao ano no cartão de crédito rotativo e mantém um spread bancário de 31,5%, o terceiro maior do mundo, segundo o Fundo Monetário Internacional”.  

Em 2024, as famílias brasileiras pagaram aproximadamente 860 bilhões de reais em juros sobre crédito, segundo dados do Banco Central e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Enquanto isso, em 2025, o mercado regulado de apostas deve movimentar um valor muito menor: cerca de 38 bilhões de reais, de acordo com outro estudo, este realizado pela LCA e pelo Instituto Locomotiva para o IBJR.

Na avaliação de Gelfi, existe outra questão que impacta esse cenário e se soma ao alto custo do acesso ao crédito no Brasil: o mercado ilegal de apostas esportivas. “Ambos os fenômenos, em escalas diferentes, afetam a renda disponível e o equilíbrio financeiro das famílias. Se o objetivo é proteger a renda do consumidor, o debate responsável precisa mirar o crédito caro e a clandestinidade — as frentes que drenam o poder de compra e merecem igual rigor”, defende o diretor.

Ataque à ilegalidade

Desde janeiro de 2025, quando entraram em vigor as regras do Ministério da Fazenda para apostas e jogos online de quota fixa, consolidou-se o mercado regulado no país. As empresas licenciadas devem uma série de exigências, como o registro no Brasil, com pelo menos 20% do capital social de origem nacional; o pagamento de 30 milhões de reais por uma licença válida por cinco anos; a manutenção de 5 milhões de reais em conta garantida; e a proibição de acesso a menores de 18 anos.

No campo tributário, seguindo as regras estabelecidas pelo Governo Federal, as empresas que ingressaram no mercado formal realizaram um aporte inicial de R$ 30 milhões para obter a autorização de operação.

Sobre a atividade, incide um modelo de tributação sobre o consumo, composto por 12% sobre a Receita Bruta de Jogos (GGR), ou seja, o valor apostado menos o retorno pago aos jogadores, somado a PIS, Cofins e contribuição previdenciária, resultando em uma carga total próxima de 25% sobre o consumo.

Além disso, as operações contribuem com tributação sobre a renda, como o IRPJ e a CSLL, bem como com a taxa de fiscalização e controle, que também compõe o custo regulatório da atividade. Esses recursos são destinados a atividades estratégicas, como esporte, turismo, segurança pública, seguridade social e educação.

Mesmo sendo um setor regulamentado há poucos meses, as apostas reguladas já demonstram seu potencial econômico e social. Apenas até setembro de 2025, o segmento arrecadou 6,85 bilhões de reais em tributos, contribuindo para áreas essenciais da sociedade brasileira. Trata-se de uma atividade que cumpre um papel relevante na economia formal, mas que enfrenta uma carga tributária robusta e um cenário de insegurança jurídica decorrente das constantes tentativas de alteração nas regras fiscais”, diz Gelfi.

Aliás, os brasileiros entendem que as apostas são entretenimento, e não investimento — é o que 70% deles afirmaram para uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Para a consolidação desse cenário, no entanto, é crucial atacar a ilegalidade, que segue elevada: o levantamento da LCA e do Locomotiva aponta que cerca de 51% das apostas ainda acontecem em plataformas clandestinas, sem nenhum tipo de fiscalização ou proteção, o que representa uma perda de mais de 10 bilhões de reais anuais em arrecadação para o país.

Além disso, 87% dos apostadores ouvidos defendem que o poder público atue de forma mais rigorosa contra essas operadoras ilegais, evidenciando uma preocupação social e econômica real com o tema. Eles entendem que as plataformas clandestinas oferecem uma série de perigos, como o risco de fraude e não pagamento, a ausência de suporte ao apostador e a possibilidade de o canal ser utilizado para lavagem de dinheiro.

A divulgação das plataformas ilegais se dá basicamente nas redes sociais, que precisam adotar medidas mais firmes para coibir essa prática”, afirma Gelfi.

Ação informativa

A partir dessa constatação, o IBJR promove a campanha Chega de Bode na Sala, criada pela agência We, com o objetivo de educar o público e mobilizar as autoridades sobre os riscos do mercado clandestino. A campanha, que está no ar entre setembro e dezembro de 2025, inclui o lançamento do Betalert, hotsite interativo que permite ao usuário verificar se uma plataforma é licenciada pelo governo federal. 

A ação deu um passo importante ao transformar um problema invisível em uma pauta pública, explicando de forma didática como identificar plataformas seguras e por que a  regulamentação é fundamental para proteger o consumidor e fortalecer o setor”, diz Gelfi.

A proposta do IBJR, em suma, é ampliar o debate sobre formas eficazes de atacar o alto nível de endividamento dos brasileiros em duas frentes. “Propomos um debate honesto e equilibrado, sem moralismos, sobre as forças que de fato compõem o orçamento das famílias”, sintetiza o diretor.

Fonte: Veja