VIE 5 DE DICIEMBRE DE 2025 - 09:21hs.
Elvis Lourenço, Chief Product Officer do Grupo Aposta Ganha

PL 2.985/2023: O Projeto de Lei que pode redefinir o marketing das casas de apostas no Brasil

O Projeto de Lei 2.985/2023 propõe restrições severas às práticas de marketing, publicidade e patrocínio no setor de apostas esportivas. Ele pode representar um verdadeiro divisor de águas para o modelo de aquisição de clientes via mídia, afiliados, patrocínio esportivo e influenciadores. Elvis Lourenço, chief product officer do Grupo Aposta Ganha, analisa seus principais impactos e como os operadores devem se preparar para uma nova era de comunicação no mercado regulado.

O mercado de apostas online no Brasil ainda se acomoda em meio ao processo de regulamentação iniciado pela Lei 14.790/2023, mas um novo desafio se aproxima: o Projeto de Lei 2.985/2023, aprovado nesta quarta (28) no Senado.

Com autoria do Senador Styvenson Valentim e relatoria do Senador Carlos Portinho, o PL propõe restrições severas às práticas de marketing, publicidade e patrocínio no setor de apostas de quota fixa.

O texto, votado de forma simbólica, agora vai à Câmara dos Deputados e pode representar um verdadeiro divisor de águas para o modelo de aquisição de clientes via mídia, afiliados, patrocínio esportivo e influenciadores digitais.

A seguir, analisamos os principais impactos do projeto e como os operadores devem se preparar para uma nova era de comunicação no mercado regulamentado.

Visão Geral do PL 2.985/2023

O objetivo declarado do projeto é proteger a população — especialmente crianças, adolescentes e grupos vulneráveis — da exposição excessiva à publicidade de apostas, alinhando o setor a padrões semelhantes aos da publicidade de bebidas alcoólicas e tabaco.

O substitutivo ao projeto inclui:

* Restrições severas de horário e conteúdo para campanhas em TV, rádio e eventos ao vivo

* Vedações ao uso de influenciadores, atletas em atividade e personalidades com apelo infantojuvenil

* Regras estritas para publicidade digital e redes sociais, exigindo autenticação e opt-in

* Proibição de qualquer material que ensine ou estimule a prática de apostas, mesmo de forma indireta

Restrições à publicidade tradicional

* Veiculação limitada ao período entre 21h e 6h

* Em transmissões ao vivo: somente 5 minutos antes e 5 minutos após o evento

* Proibida a exibição de odds dinâmicas, bônus e promoções em tempo real

* Obrigatoriedade da mensagem: “Apostas causam dependência e prejuízos a você e à sua família”.

Isso coloca o Brasil em um modelo semelhante ao “whistle-to-whistle ban” adotado no Reino Unido, com o objetivo de proteger o público infantojuvenil e evitar o estímulo impulsivo.

Publicidade digital e controle do usuário

* Permitida apenas para usuários maiores de 18 anos e devidamente autenticados

* Opt-in obrigatório para push notifications, e-mails e mensagens promocionais

* Direito do usuário de desabilitar anúncios de apostas — inclusive em plataformas com conteúdo compulsório (versões gratuitas)

Essas medidas demandarão fortes ajustes em mídia programática, remarketing e campanhas por CRM, forçando os operadores a investir em segmentações de primeira parte e comunicação altamente permissiva.

Marketing de influência e endossos

Proibição total do uso de:

* Atletas em atividade

* Celebridades, comunicadores e artistas

* Influenciadores digitais com público geral

Exceção: apenas ex-atletas aposentados há mais de 5 anos, sem apelo infantojuvenil

Impacto direto: redução do alcance, do engajamento orgânico e da prova social gerada por campanhas com rostos conhecidos. Isso compromete significativamente estratégias em redes sociais, streaming e campanhas de awareness.

Programas de afiliados sob alvo

* Afiliados estarão sujeitos às mesmas restrições de horário e conteúdo

* Proibidos conteúdos que ensinem, estimulem ou façam comparativos entre apostas, mesmo de forma didática

* Plataformas, operadores e afiliados podem ser responsabilizados solidariamente

Isso representa uma ameaça direta ao modelo de afiliados tradicional, exigindo revisão urgente de contratos e estratégias de conteúdo.

Patrocínios e naming rights

Permitido o patrocínio a times, estádios e eventos, mas com restrições:

* Proibição em uniformes de menores de 18 anos

* Proibição em camisas infantis comercializadas

* Naming rights permitidos, mas sob regras específicas

Essa mudança impacta diretamente clubes, ligas e plataformas de mídia esportiva, que têm nas bets uma das principais fontes de receita atualmente.

Impactos nos indicadores de negócio

* CAC (Custo de Aquisição por Cliente) deve subir, com menos canais e janelas de mídia

* LTV (Valor do Cliente ao Longo do Tempo) pode cair, devido à redução de recorrência induzida por campanhas e bônus

* Brand awareness será enfraquecido, especialmente com a limitação de mídia espontânea e influenciadores

* Operadores terão que compensar via gamificação, CRM, fidelização e dados próprio

Recomendações para operadores


Embora o PL 2.985/2023 ainda esteja em tramitação no Congresso e possa sofrer alterações na Câmara, flexibilizações ou até ser arquivado, o texto atual revela uma clara sinalização política e social sobre a direção que a publicidade de apostas pode tomar no Brasil.

Diante disso, os operadores devem adotar uma postura proativa e preventiva, incorporando boas práticas que reduzam riscos regulatórios e fortaleçam sua reputação junto ao público e aos órgãos fiscalizadores:

* Mapeie todos os canais de marketing utilizados atualmente, com atenção especial a campanhas com influenciadores, mídia programática e patrocínios esportivos.

* Reforce as diretrizes internas de compliance publicitário, mesmo sem obrigação formal, adotando políticas similares às de setores regulados como bebidas alcoólicas e produtos financeiros.

* Implemente sistemas robustos de verificação de idade e consentimento, especialmente para push notifications, e-mails e campanhas digitais segmentadas.

* Reveja contratos com afiliados e influenciadores, incluindo cláusulas de adequação imediata caso novas restrições sejam implementadas.

* Invista em canais próprios e em first-party data, reduzindo a dependência de mídia de massa e construindo uma base de relacionamento mais qualificada.

* Acompanhe ativamente o processo legislativo e regulatório, com apoio jurídico e institucional, para se antecipar a mudanças e adaptar-se rapidamente.

Mesmo que o projeto não avance na forma como está, o movimento regulatório mais restritivo ao marketing de apostas já está em curso, e operar com responsabilidade e transparência não é apenas prudente — é estratégico.

Conclusão: Um alerta para o futuro do marketing no iGaming

O PL 2.985/2023 representa uma proposta ambiciosa e restritiva para o marketing de apostas no Brasil — e, embora seus objetivos estejam alinhados à proteção do consumidor e à promoção do jogo responsável, seus impactos operacionais e comerciais são significativos.

Ainda que o projeto esteja em tramitação e possa ser modificado, flexibilizado ou até mesmo não prosperar, ele já serve como alerta para os operadores: a tendência é de um ambiente publicitário mais controlado, com foco em transparência, segmentação e responsabilidade social.

Por isso, mesmo sem a aprovação imediata do PL, as casas de apostas devem começar a repensar suas estratégias:

* Reduzir a dependência de mídia de massa e influenciadores;

* Priorizar canais próprios, CRM e first-party data;

* Implementar políticas de publicidade responsável, mesmo antes da obrigação legal.

Em um mercado regulado cada vez mais maduro, quem estiver à frente das exigências — e não apenas reagindo a elas — terá vantagem competitiva e reputacional.

Elvis Lourenço

Chief Product Officer do Grupo Aposta Ganha