Games Magazine Brazil - Diante das recentes mudanças nas regras que regem o setor de apostas no Brasil, há base legal para que empresas que já investiram com base no marco anterior aleguem quebra de segurança jurídica ou expectativa legítima? Essas mudanças podem ser contestadas judicialmente?
Witoldo Henrich Jr.- Eu me lembro de um painel há alguns anos, possivelmente antes de 2018 (quando veio a MP do Temer), com os amigos Luiz Felipe Maia e Ricardo Magri. Na ocasião, discutíamos qual o melhor modelo, se seria uma concessão, permissão ou algum outro veículo jurídico a viabilizar a exploração das apostas.
São modelos distintos, mas, para fins dessa pergunta, poderíamos dizer que a concessão é um contrato entre o privado e o particular, cujos termos engessam ambos. Luiz Felipe defendia que o modelo de concessão seria mais seguro, pois as regras estariam todas postas antes da assinatura do contrato de concessão. Eu, ao contrário, achava que uma autorização seria justamente mais maleável e que, como as apostas sofrem direta interferência da tecnologia, este modelo daria mais agilidade normativa para adequar possíveis necessárias mudanças ao longo do caminho. O governo parece ter seguido este segundo caminho.
Se tivessem seguido o caminho defendido pelo meu amigo, hoje, talvez não tivéssemos que discutir esse assunto e, nesse aspecto, devo concordar com o Maia. Um processo restrito de concessão é realmente muito mais estável e previsível para o concessionário.
De qualquer forma, enxergo um certo nível de comprometimento do “Brasil” com a carga tributária de 12%. Explico: Essa receita é proveniente do regular exercício desta atividade específica e veio à luz através do mesmo veículo normativo que legalizou a operação de apostas no Brasil.
Os operadores aplicaram para operar dentro de um ecossistema jurídico fechado, entregue pelo “Brasil” à iniciativa privada. Eu vejo margem para brigar pela manutenção dos 12%, caso mudem esse quadro. Situação completamente diferente seria se aumentassem PIS, COFINS, IRPJ etc... de todos os contribuintes indistintamente.
A insegurança jurídica causada por alterações frequentes na regulamentação pode levar a ações judiciais contra o Estado brasileiro? Investidores estrangeiros também poderiam recorrer a mecanismos internacionais?
Sem dúvida essas discussões vão terminar na justiça. É uma pena. Estou há mais de 10 anos “vendendo” o Brasil lá fora junto com meus amigos da indústria, mostrando a seriedade do país, a maturidade empresarial etc.
Aí vêm essas ações esquisitas, as idas e vindas, os boatos... jogam anos de trabalho fora. Tenho dúvidas se mecanismos internacionais são viáveis, mas eu não descarto nada. Está tudo tão maluco hoje em dia, que nada é impossível.
Caso o governo decida aumentar novamente a carga tributária das apostas – por exemplo, como compensação à redução do IOF – há caminhos legais para que as operadoras questionem esse aumento?
Como eu falei antes: os operadores “compraram” um ecossistema fundado pelas leis 13756 e 14790. Mudas as regras depois de receber R$ 35 milhões dos operadores me parece uma brincadeira de mau gosto. Eu vejo margem para discutir isso judicialmente sim.
Quais mecanismos legais poderiam ser adotados para garantir maior previsibilidade e estabilidade regulatória para o setor? Seria possível propor ao Congresso a inclusão de cláusulas de transição ou salvaguardas específicas para operadoras que já estão atuando no país?
Honestamente, eu penso que se fosse pro governo aceitar uma transição, eles aceitariam não mexer em nada. O governo atual não me parece capaz de arrefecer. É um governo desesperado por receitas pois não consegue fechar suas contas básicas. Infelizmente.
Eu escrevi algumas vezes e falei isso diversas nos painéis dos nossos eventos. O PT nunca foi favorável ao jogo. Decidiram regulamentar pelos motivos errados. Eles olham para a indústria e só conseguem ver bilhões em faturamento.
A elevação inesperada da carga tributária pode afetar contratos comerciais já firmados por operadoras, como acordos com fornecedores e clubes esportivos? Que tipo de cláusulas contratuais poderiam proteger essas relações?
Com certeza. Dos contratos atuais a que tive acesso, aqui no escritório, muitos fazem referência a GGR menos 12%. Se mudar os 12%, vai mudar tudo.
Em relação a contratos de patrocínio, quando nós intermediamos os primeiros contratos de patrocínio que a Luciana Hendrich trouxe para o Brasil, em propriedades tipo Vasco, Fortaleza, Red Bull, Maracanã, em todos tínhamos cláusulas que protegiam o operador de mudanças legislativas. Hoje em dia não sei como anda isso, pois acabamos nos afastando um pouco dessa intermediação direta. Espero que tenham.
E quanto aos contratos de publicidade e patrocínio baseados na legislação anterior: existe margem legal para revisão ou rescisão em função das novas restrições impostas?
Em geral, contratos possuem cláusulas de escape diante de casos fortuitos, força maior e atos do poder público incompatíveis com a execução contratual.
Como disse, aqueles contratos iniciais de patrocínio que tivemos oportunidade de participar tinha tais previsões. É bem verdade que, naquela época, não havia muita regulamentação e era imprescindível prever possíveis constrições estatais às apostas, ainda desregulamentadas. A conferir.
Fonte: Exclusivo GMB