VIE 5 DE DICIEMBRE DE 2025 - 08:31hs.
Tiago Horta Barbosa, head de Integridade da Genius Sports para LatAm

O propósito da regulação do mercado de apostas é proteger, não arrecadar

Tiago Horta Barbosa, head de integridade da Genius Sports para a América Latina, alerta para o desvio de foco da regulamentação das apostas no Brasil. Segundo ele, o excesso de ênfase na arrecadação ameaça a função essencial do Estado: proteger o mercado, o consumidor e a integridade esportiva. Regular é disciplinar, fiscalizar e controlar — e não apenas gerar receita.

A regulamentação do mercado de apostas de quota fixa no Brasil foi uma resposta necessária do governo à crescente relevância econômica e social desse segmento.

Contudo, ao observar o desenho institucional e, em especial algumas ações recentes, nota-se uma perigosa inversão de finalidade na medida em que a questão arrecadatória tem sido priorizada cada vez mais, adquirindo protagonismo exagerado no processo de regulação.

Tal perspectiva se afasta do entendimento clássico quanto ao papel regulatório de mercados que deve ser, sobretudo, o de disciplinar, fiscalizar e controlar. Arrecadar deve ser tido como meio para se alcançar tais objetivos — não pode ser o propósito em si.

Não é o que temos visto, porém!

 A regulação é um instrumento de política pública. Deve ter como função precípua promover ajustes, corrigir falhas de mercado, fomentar a justiça social, proteger o consumidor, garantir a concorrência e preservar valores públicos.

Essa lógica, entretanto, acaba ignorada quando o governo assume uma postura prioritariamente arrecadatória, tratando a atividade regulada como simples fonte de receita.

Em se tratando do mercado de apostas, o foco deveria ser:

- Disciplinar o mercado, impondo limites à atuação dos agentes privados;

- Fiscalizar a conformidade das operações com normas legais e princípios éticos; 

- Controlar os riscos sistêmicos associados à atividade, especialmente os relacionados à lavagem de dinheiro, vício em jogos e manipulação de resultados esportivos.

E ponto final.

Veja bem!

É legítimo que o ente estatal arrecade com a regulação. Mas o limite disso é o não desvirtuamento de sua missão pública.

O ponto a ser observado aqui é que a combinação de alta carga tributária com burocracia regulatória tende a gerar o efeito perverso de afastar operadores sérios e alimentar a informalidade.

Só que isso deveria ser evitado a qualquer custo!

Tributos excessivos, longe de proteger a sociedade, tendem sim a asfixiar o mercado regulado, tornando o ambiente legal menos competitivo e mais vulnerável à evasão.

Como consequência, fortalece-se o mercado ilegal — que opera sem encargos, sem controle e sem qualquer compromisso com a integridade, o consumidor ou o Estado.

Fato é que quando a arrecadação se torna o fim em si mesma, inverte-se a lógica do interesse público: criam-se obstáculos à formalização, desincentiva-se a conformidade e se favorece, paradoxalmente, aquilo que a regulação pretende combater — o mercado ilegal.

Ou seja, não há qualquer ganho para a sociedade aí.

Entenda!

O Brasil tem a oportunidade de construir um modelo de regulação moderno e eficaz para o setor de apostas. E esse modelo deve servir à sociedade.

Mas para que isso ocorra é necessário que a regulamentação seja concretada sobre os propósitos corretos.

Que se tribute, sim. Mas dentro dos parâmetros que não tornem o mercado inviável. O Estado não pode se esquecer de que regular é, acima de tudo, sobre proteger, não sobre arrecadar.

Tiago Horta Barbosa
Head de Integridade da Genius Sports para a América Latina

O especialista integra o Comitê de Integridade da Federação Internacional de Tênis de Mesa (ITTF). Possui graduações em relações internacionais e direito, além de pós-graduação em Direito e Gestão do Esporte (FIFA/CIES/UCA) e mestrado em Direito do Esporte (ISDE Madrid). Atuou ainda como Oficial de Treinamento Policial junto à OIPC-Interpol de 2012 a 2014. Tiago Horta Barbosa tem sido notadamente ativo no setor jurídico-esportivo desde 2015. Ele é especializado em integridade esportiva, com foco nos temas relacionados à prevenção e o combate à manipulação de competições, bem como no impacto dos mercados de apostas no esporte.