JUE 25 DE ABRIL DE 2024 - 07:37hs.
30 de abril de 1946

Preto 31… E os cassinos foram fechados no Brasil

Os cassinos no Brasil foram fechados pelo decreto-lei 9215, de 30 de abril de 1946, do presidente Eurico Gaspar Dutra. O presidente foi influenciado por sua esposa, uma mulher extremamente religiosa e contrária ao jogo, e pelo ministro da Justiça, Carlos Luz, que desejava ser governador de Minas Gerais. Uma proibição que leva 71 anos.

Preto 31… E os cassinos foram fechados no Brasil

Cassino Atlântico, no Rio de Janeiro, em 1946

Preto 31… E os cassinos foram fechados no Brasil

Imagem externa total do Morro, do sistema funicular e do casarão do antigo cassino. Ano: Por volta de 1930.

Preto 31… E os cassinos foram fechados no Brasil

"Salão Nobre" do cassino de Mont Serrat Ano: Por volta de 1930

Preto 31… E os cassinos foram fechados no Brasil

Cassino Ano: 1934

Preto 31… E os cassinos foram fechados no Brasil

Cassino Ano: 1939

Cassino Ano: 1939

"Senhores e senhoras, façam suas apostas para a última jogada de roleta no Brasil!”… Em tom solene, tentando segurar lágrimas que brotavam de seus olhos, José Caribé da Rocha, diretor do cassino Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, anunciou, às 11 horas da noite do dia 30 de abril de 1946, a última partida de roleta em cassinos brasileiros, encerrando um período de muito glamour, histórias e luxo. Após o anúncio, o choro contido aflorou, expressando em seu rosto o mesmo sentimento de milhares de freqüentadores e de mais de 40 mil trabalhadores dos cerca de 70 cassinos que existiam no Brasil naquela época. Poucos minutos depois, PRETO 31…

O Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais eram os três estados considerados capitais dos cassinos brasileiros, numa época em que os shows musicais ao vivo nos grandes salões do Copacabana Palace, Quitandinha, Atlântico, Urca, Parque Balneário Hotel e Grande Hotel de Araxá eram referência tanto para artistas nacionais como para estrelas de primeira grandeza dos palcos mundiais.

Os cassinos no Brasil foram fechados pelo decreto-lei 9215, de 30 de abril de 1946, do presidente Eurico Gaspar Dutra. O presidente foi influenciado por sua esposa, dona Carmela (conhecida como dona Santinha), uma mulher extremamente religiosa e contrária ao jogo, e pelo ministro da Justiça, Carlos Luz, que desejava ser governador de Minas Gerais e lutou contra os cassinos em nome da "tradicional familia mineira". Fechou os cassinos... mas perdeu a eleição! 


 Imagem externa total do Morro, do sistema funicular
e do casarão do antigo cassino (1930)


Naquele fatídico dia para o setor, o presidente reuniu-se com seus ministros, secretários de Estado e com o chefe do Departamento Federal de Segurança Pública para discutir dois assuntos delicados: o fechamento dos cassinos e o combate ao comunismo. Resolveu acabar com os cassinos e deixou para depois a caça aos comunistas. Por ironia do destino, tanto um quanto outro foram para a clandestinidade e sofreram anos a fio. Felizmente os comunistas ganharam seu lugar ao sol… os casinos, ainda não.

A repercussão do fechamento dos cassinos foi imediata e a maioria dos jornais que circularam naquela tarde com manchetes sobre o fim dos cassinos esgotaram-se rapidamente. Destaque para o "Resistência”, do dia 5 de maio, defendendo os milhares de empregos em jogo: "Duro Golpe No Futuro Artístico Do País!” : "Coerente com as suas diretivas, Resistência inicia um movimento de apoio ás reivindicações de todos aqueles que, por força do decreto-lei que extinguiu o jogo, se viram em situação de inesperado desajustamento em sua atividade laboriosa. (...)".

Como se vê, mesmo nos anos 40 a força do setor na geração de empregos era substancial e a preocupação social com os desempregados esteve presente na imprensa, embora de maneira muito tímida, já que o Brasil recém saído da ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas ainda não tinha conquistado a liberdade de imprensa e alguns dos mais importantes jornais da época apoiavam o governo Dutra.


Do dia para a noite

Mas acabar com uma atividade até então autorizada pelo poder público da forma como foi feito, mais do que desrespeito, foi extremamente truculenta. Em vez de se estabelecer um prazo para o fim dos cassinos, o decreto-lei entrou em vigor na data de sua publicação, pegando de surpresa empresários, funcionários e artistas que tinham contratos de apresentação nos cassinos.

Podemos falar até em traição do governo, já que durante a campanha eleitoral, o opositor de Dutra, brigadeiro Eduardo Gomes, defendia com unhas e dentes o fim dos cassinos. Por essa postura, vários empresários do setor investiram na candidatura Dutra. Assumiu em janeiro e três meses depois deu o golpe de misericórida na atividade. Outro exemplo do impacto que uma medida como essas provocou foi o Cassino Lambari, em Minas Gerais, inaugurado um dia antes da proibição da atividade. Alguém indenizou os investidores? 

 

 Cassino (1934)


Sucesso e luxo

Na época de ouro do jogo no Brasil, o mais charmoso, luxuoso e incrível cassino era o do Copacabana Palace, onde reunia-se a nata da sociedade brasileira para jogar, dançar, jantar e assistir a ótimos shows (inclusive internacionais). Somava-se a ele o também sensacional e bem freqüentado Cassino Atlântico, no final da avenida Atlântica, em Copacabana, com grandes shows nacionais e internacionais.

Mas quando se fala em cassino no Brasil, o primeiro nome que vem à mente é o Cassino da Urca, pela sua beleza, luxo e glamour, palco que lançou muitos artistas famosos do país, de propriedade de um ex-tropeiro de burros quase analfabeto, o mineiro Joaquim Rolla, que também construiu outro cassino que ficou na história dos amantes do jogo em casas maravilhosas, o Hotel Quitandinha, em Petrópolis.

São Paulo também tinha seus cassinos glamorosos, principalmente o Parque Balneário Hotel, em Santos, o marco da finesse e do jet set paulista. Havia, ainda, o cassino do Ilha Porchat Clube, o Casino Monte Serrat (que recebia banqueiros, juízes, personalidades da alta sociedade brasileira da época e muitos políticos influentes, como o governador Júlio Prestes, Dino Bueno), Miramar e Atlântico, todos em Santos, e o Grande Hotel, no Guarujá. No interior de São Paulo, outras belas casas estavam localizadas em Serra Negra, Campos do Jordão e Águas de São Pedro.

Em Minas Gerais foi inaugurado em 1941 por Benedito Valadares e Israel Pinheiro o Grande Hotel de Araxá, uma referência no estado. Além dele, o Cassino da Pampulha, em Belo Horizonte, os famosos Quisisana e Palace, em Poços de Caldas, e o Brasil, em São Lourenço (que tinha nada menos que oito cassinos e 40 hotéis à sua volta), o mais luxuoso do país e palco de artistas de renome da época, como Luís Gonzaga (o Rei do Baião) e Francisco Alves (o Rei da Voz). Na Praia da Boa Viagem, em Recife, havia o Cassino Americano, instalado para atender aos soldados dos Estados Unidos baseados no Brasil na época da Segunda Guerra Mundial.

 

 "Salão Nobre" do cassino de Mont Serrat (1930)

Todo o glamour, luxo e milhares de empregos foram jogados fora pelo decreto-lei 9.215. A fase de ouro dos cassinos chegou ao fim e, com ela, grandes oportunidades de descoberta de novos talentos, dezenas de milhares de empregos, investimentos nos complexos e uma alternativa de lazer para turistas estrangeiros e para brasileiros que gostavam de jogo, sem contar nos impostos que eram cobrados da atividade. Extingüindo-a, o presidente Dutra não acabou com os cassinos, colocou-o na clandestinidade e, com isso, atrelou-o a uma funesta relação: a corrupção.

Atualmente existe no Congresso Nacional dois projetos para regulamentação do jogo no Brasil. O vai e vem da política ainda não colocou nenhum dos dois em votação final. Qualquer um dos dois seria uma excelente oportunidade para o presidente Michel Temer conseguir milhões de empregos numa fase tão difícil para a economia brasileira. Sem contar nos impostos que a atividade irá proporcionar num momento em que as receitas estão à mingua. Que tal, senhores parlamentares? Vamos virar o jogo? Que tal, senhor presidente, buscar o apoio que falta para apostar num país com uma legislação moderna para o jogo?


Fonte: GMB
Autor: Gildo Mazza
(*) Agradecimentos especiais aos amigos Ciro Batelli e Magno José


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