VIE 5 DE DICIEMBRE DE 2025 - 10:15hs.
Secretário de Prêmios e Apostas

Regis Dudena defende que cassinos físicos devem ser 'rigorosamente regulados' antes de operar

O secretário de Prêmios e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda, Regis Dudena, afirma que, caso o Congresso aprove a liberação de cassinos físicos será necessário garantir que o novo mercado seja “rigorosamente regulado antes de começar a operar”. Para ele, caberá à SPA o estabelecimento das regras para a futura atividade. A afirmação foi dada em entrevista exclusiva à Exame.

O secretário afirma que a regulamentação das apostas online serviu de aprendizado. Liberadas em 2018, as bets operaram no Brasil por quatro anos sem regulamentação e cobrança de impostos.

A experiência de 2019 a 2022 nos ensinou que não podemos apressar o processo. Precisamos de tempo para criar regras claras e detalhadas para garantir um mercado seguro e bem estruturado”, afirma.

Dudena diz o governo respeita qualquer decisão do Congresso e que observa a questão como órgão regulador da atividade. "A lei em tramitação define que a competência para regulamentação será do Ministério da Fazenda, e já ouve emenda de redação para constar como nossa responsabilidade [SPA]”, afirma.

O PL 442/91, que trata da legalização dos cassinos, bingos e jogo do bicho, já foi aprovado na Câmara em 2022, mas aguarda votação no Senado, sob a relatoria do senador Irajá (PSD-TO).

O projeto original tramita no Congresso há 33 anos. A proposta enfrenta resistência de setores conservadores do Congresso, mas tem apoio de parlamentares que defendem sua capacidade de geração de empregos e arrecadação tributária.

Combate às bets ilegais

Na entrevista, Dudena afirma ainda que o Brasil conseguiu uma "regulamentação é bem feita e que exige que as empresas cumpram as regras".

"A nossa regulamentação é bem feita e exige que as empresas cumpram as regras, com fiscalização ativa. Estamos fazendo ciclos de fiscalização e monitoramento, como no caso dos bônus de entrada, e monitorando o comportamento de influenciadores”, afirma.

Desde janeiro, apenas bets autorizadas pelo Ministério da Fazenda podem operar no Brasil, com regras específicas, como a utilização do domínio bet.br. Atualmente, 73 empresas estão autorizadas, somando 162 sites legalizados, além de outras oito empresas que atuam por decisão judicial, ligadas a 18 marcas.

O principal desafio, segundo Dudena, é combater a ilegalidade. O secretário diz que a estratégia passa por três frentes: derrubada de domínios ilegais, restrição de publicidade e redes sociais e estrangulamento financeiro.

Entrevista completa

Como o governo está observando esses mais de 100 dias de regulamentação? O que foi possível implementar da forma como a lei definiu e o que ainda precisa ser adaptado?

Algumas coisas que são, do nosso ponto de vista, bastante positivas. Começamos a deixar de falar das coisas no futuro no sentido de "vai haver regras ou estamos criando regras". Agora, todas as regras estão em vigor. Nós temos empresas conhecidas e prestando um serviço de uma forma regulada. Os desafios, a partir disso, se bifurcam na minha cabeça em duas frentes. Existe uma frente, que é o mercadoregulado, que precisa ser monitorado, fiscalizado, e precisamos lidar com eventuais descumprimentos, inclusive para fins de sanção. E existe um segundo desafio que se tornou bastante significativo: o combate à ilegalidade.

Você pode detalhar um pouco mais sobre o combate à ilegalidade?
Sim, no combate à ilegalidade temos um papel a ser desempenhado de conscientização, talvez seja a melhor palavra. A população precisa entender que, se você quiser apostar, saiba o que é aposta. Não é investimento, é uma forma de gastar dinheiro para entretenimento. Acredito que essa mensagem precisa chegar de forma mais ampla. E, se for apostar, deve buscar uma casa autorizada, que é o único lugar onde os apostadores vão ter sua saúde mental e financeira protegidas. Em paralelo, o que temos feito é atacar, de fato, a ilegalidade. Temos pelo menos três frentes relevantes. A primeira é o contínuo derrubar de domínios ilegais. Isso é um trabalho difícil e custoso, mas necessário. Já derrubamos mais de 11 mil sites desde o início do ano.

Você mencionou o custo, tanto operacional quanto financeiro, ao realizar essas ações. Poderia explicar melhor?
O custo é indireto, digamos assim. Não é um gasto extra diretamente, mas a necessidade de alocar pessoas para fazer monitoramento, para fazer o reconhecimento de empresas e seus prestadores de serviço. No caso da administração pública, os recursos são escassos, então não é só um gasto adicional, mas o tempo e as equipes para fazer esse trabalho.

Qual a segunda medida?
A segunda frente é a relação com as redes sociais e plataformas digitais. Buscamos que eles implementem uma restrição legal e regulatória para não permitir a presença desses ilegais em suas plataformas. O Conselho Nacional Autorregulamentação Publicitária (Conar) tem sido um parceiro relevante na autorregulação publicitária. Com isso, os elos da cadeia publicitária barram a ilegalidade.

E a última?
A terceira frente é a financeira, que envolve uma proibição de instituições financeiras e de pagamento de prestarem serviço para sites ilegais, conforme determinado pela lei. Nós soltamos uma portaria regulando isso para complementar a lei aprovada no ano passado. Estamos buscando que as Instituições Financeiras e de Pagamento (IFIPs) monitorem e reportem a existência desses sites para nós. Essas três frentes juntas têm a expectativa de conseguir estrangular essas empresas que insistem em prestar esse serviço de forma ilegal.

Especialistas e casas de apostas reguladas afirmam que a principal medida para estrangular as ilegais é por meio da questão financeira. Como você vê essa questão? 
Eu não subvalorizaria a derrubada de domínios. Isso é um grande desafio para eles. Eles precisam refazer campanhas publicitárias, mudar seus links, o que é complicado e desmotivador. Agora, a questão financeira realmente é um fator-chave. Se as instituições financeiras pararem de prestar serviços para as casas de apostas ilegais, aí, sim, eles vão ter dificuldades reais para operar. Essas medidas são complementares. A questão financeira, especialmente, pode ser bastante eficiente, pois o lucro é a principal motivação dessas empresas.

Já é possível estimar o tamanho do mercado de apostas brasileiro? 
Sobre a canalização do mercado, ainda não temos um número exato, estamos trabalhando com algumas ferramentas de monitoramento, mas ainda estamos na fase de derrubada dos sites antes de dimensionarmos o mercado. Na nossa portaria de jogo responsável, ao tratar de publicidade, falamos, por exemplo, sobre a necessidade de as casas reforçarem o Jogo Responsável. Também está prevista a necessidade de falar sobre a restrição etária para 18 anos ou mais.

E sobre a judicialização, vocês já esperavam? Como o Ministério está atuando nesses casos?
Nós sempre esperamos a judicialização. O que nos cabe é prestar informações ao judiciário. Estamos bastante convictos de que não cometemos qualquer desvio nas decisões, e que as empresas que foram indeferidas cumpriram as exigências. As ações judiciais em relação a liminares têm sido diminutas em comparação com o número de indeferimentos e desistências. Acreditamos que a maior parte dessas disputas será revista pelas instâncias superiores, que irão entender melhor o contexto da regulamentação e a proteção dos apostadores. A aposta no Brasil é um serviço público, e a decisão de quem pode ou não prestar esse serviço é discricionária, fundamentada no interesse público.

Como a Secretaria planeja conscientizar a população sobre os riscos das apostas? Será por meio de campanhas governamentais ou exigindo que as operadoras façam isso? Já vemos que as próprias casas fazendo campanhas com o mote do Jogo Responsável.

Essas mudanças não são espontâneas, elas respondem diretamente à regulamentação. Acredito que as empresas entenderam que uma publicidade excessiva pode gerar consequências negativas, inclusive legislativas. O Conar tem sido um parceiro importante, regulando toda a cadeia publicitária. Também temos a possibilidade de exigir que as operadoras façam campanhas de conscientização institucional em nosso nome [governo], o que está sendo planejado. Nós também pretendemos realizar campanhas públicas de conscientização, com o máximo de cuidado necessário. Queremos esclarecer o que é uma aposta, a diferença entre empresas legais e ilegais, e promover a proteção da saúde mental dos apostadores. Estamos trabalhando nisso e, em breve, teremos novidades.

Ainda sobre a questão da publicidade, o que o senhor pensa sobre a proibição da publicidade de apostas, que está sendo discutida no Congresso?
Nossa posição é clara: respeitamos decisões judiciais e a competência do Legislativo. O Congresso é soberano para decidir o que deve ou não ser permitido. Como órgão regulador, cabe a nós indicarmos os possíveis efeitos de cada ação. Nosso receio com a proibição da publicidade é que, ao proibir totalmente, a população perca o critério de identificação de empresas autorizadas. A publicidade é uma das formas de distinguir as empresas legais. Caso essa proibição se concretize, precisaremos criar outros mecanismos para ajudar os apostadores a identificar as operadoras autorizadas, como já fazemos com o domínio “.bet.br”.

Outro tema em discussão no Congresso é a liberação de cassinos físicos. Como o governo vê essa discussão? 
Em relação à liberação de cassinos físicos, o projeto de lei em tramitação define que a competência para regulamentação será do Ministério da Fazenda, e já houve emenda para constar como nossa responsabilidade [SPA]. A nossa expectativa é que, uma vez aprovado, o projeto de lei seja regulamentado pela Secretaria. Para nós, o mais importante é garantir que qualquer mercado novo, como o de cassinos, seja rigorosamente regulamentado antes de começar a operar. A experiência de 2019 a 2022 nos ensinou que não podemos apressar o processo. Precisamos de tempo para criar regras claras e detalhadas para garantir um mercado seguro e bem estruturado.

E sobre a questão das apostas e o Bolsa Família? 
Estamos buscando formas de cumprir a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para proibir uso do Bolsa Família em casas de apostas. Logo que tivermos uma solução, vamos divulgar.

Qual o balanço de todas essas medidas?
Tivemos um grande ganho ao conseguir estabelecer um mercado regulamentado, algo que deveria ter sido feito desde 2019. Ficamos quatro anos sem nada feito, à vera. Em 2023, o governo resolveu os problemas com medidas como a MP, envio de projeto de lei e a criação da Secretaria. Conseguimos finalizar a regulamentação até julho e combater empresas não autorizadas, que ainda não haviam solicitado a autorização, especialmente após a virada do ano. Agora, é hora de afinar a execução. A nossa regulamentação é bem-feita e exige que as empresas cumpram as regras, com fiscalização ativa. Estamos fazendo ciclos de fiscalização e monitoramento, como no caso dos bônus de entrada, e monitorando o comportamento de influenciadores. O problema se divide entre influenciadores que promovem sites ilegais e os que, mesmo promovendo sites legais, fazem afirmações proibidas, como a de que apostas garantem ganhos fáceis. Estamos no caminho certo, implementando controles eficazes. O trabalho de fiscalizar, monitorar e punir os desvios será contínuo daqui para frente.

Fonte: Exame