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Lançamento exclusivo do texto

Luiz Carlos Prestes Filho escreve sobre a Indústria de Jogos no novo livro de Vinicius Lummertz

O ex-ministro do Turismo, Vinicius Lummertz, que assumiu a mesma secretaria no Estado de São Paulo, vai lançar seu livro intitulado “Brasil, potência mundial no turismo” dia 26 de fevereiro, no Jockey Club de SP. Luiz Carlos Prestes Filho, especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, é um dos escritores convidados por Lummertz e apresenta antes, aqui no Games Magazine Brasil, o seu texto “Turismo e a Indústria de Jogos no Brasil“.

O livro “Brasil - Potência Mundial do Turismo” será lançado na sede do Jockey Club de São Paulo, às 19h, nesta terça-feira, 26/02/2019. O mesmo contém um conjunto de textos que debate o turismo através da indústria do entretenimento, transporte, cultura, gastronomia, e hotelaria, entre outros temas. O coordenador editorial do livro é o ex-Ministro do Turismo, Vinicius Lummertz, atual Secretário de Turismo do Estado de São Paulo.

Luiz Carlos Prestes Filho, Especialista em Economia da Cultura, defende no livro os jogos de apostas em dinheiro, administrados pela iniciativa privada, como atividade fundamental para o desenvolvimento do turismo. Em especial, com competência cientifica demonstra que é urgente a necessidade de regulamentação dos Cassinos, dos Bingos e do Jogo do Bicho no Brasil .

Publicamos abaixo, com exclusividade, o texto do professor Prestes Filho que nos últimos anos realizou os únicos estudos acadêmicos sobre o tema no Brasil. Seu livro “A Teoria das Probabilidades no Jogo, na Ciência e nas Politicas Publicas” (E-papers 2017) e a publicação “O Jogo entre o licito e o ilícito - Tempo Livre como Atividade Econômica” (UFRJ-Coppe/Crie 2013) são obras clássicas para os especialistas:
 


Turismo e a Indústria de Jogos no Brasil
- devemos romper com leis de governos autoritários -
(Texto de Luiz Carlos Prestes Filho*)


A revista “Forbes Brasil” (06/2016) informou que a empresa vietnamita Imex Pan Pacific Group deve injetar US$ 4 bilhões em um projeto de construção de cassinos na cidade de Ho Chi Minh. Será um complexo de jogos que terá um hotel cinco estrelas de 559 quartos, um anfiteatro para 2.000 pessoas, um parque aquático e uma montanha-russa.

Cito o Vietnã para mostrar o que pode acontecer com um país quando este abandona os preconceitos e o xenofobismo. Quem poderia imaginar, há 40 anos, que esta nação que enfrentou com Guerra de Guerrilha os Estados Unidos, em profunda decadência social e econômica, elegeria o turismo aliado a jogos de apostas em dinheiro como uma das vertentes de desenvolvimento?

Os números da Indústria do Turismo do Vietnã já são bem positivos. Ao incentivar o projeto acima, constatamos que o governo daquele país deseja “roubar” jogadores de Las Vegas, EUA, e de Macau, China. Entende que a Guerra de Guerrilha hoje não é cabível. Os métodos dos anos da Guerra Fria devem ficar para trás.

Incrível quando constatamos que o Brasil, com o território de 8 milhões de km² e 200 milhões de habitantes, recebe 5 milhões de turistas anualmente. Já o pequeno Vietnã, com o território de 331 km² e com 90 milhões de habitantes, recebe 19 milhões de turistas!

Essa nossa situação foi criada por conta da não regulamentação completa da Constituição de 1988, que não anulou leis baseadas na Constituição do Estado Novo de Getúlio Vargas (1937), na Constituição da época da Guerra Fria (1946) e na Constituição do Governo Militar de (1967).

Três atos presidenciais evidenciam a afirmativa acima exposta. O Decreto-Lei 3.688/1941, a Lei das Contravenções Penais, foi criado para proibir o “Jogo do Bicho”. Assinado quando o Estado Novo estava no seu ápice e o ditador Getúlio Vargas assumia publicamente a sua vontade de aliança com o nazi-fascismo. Ano que teve seu início com um simpático telegrama de Vargas a Adolf Hitler, por conta do aniversário daquele que foi um dos maiores assassinos da História da humanidade.

O Decreto-Lei 9.251/1946, assinado pelo presidente, Eurico Gaspar Dutra, veio para exterminar os jogos privados no Brasil, especialmente os cassinos, eliminando milhares de empregos diretos e indiretos, redutos artísticos, fluxo turístico e importante receita tributária. Era o início da Guerra Fria, entre os Estados Unidos e a União Soviética e os jogos eram vistos naquele contexto. O advogado Trajano Ribeiro, ex-presidente da Empresa Municipal de Turismo do Rio de Janeiro (RioTur), tem uma opinião original sobre aquele momento:
 

“Para os americanos, que iniciavam em 1946 a estruturar Las Vegas e toda a atual indústria de jogos nos EUA, os cassinos brasileiros incomodavam. Nossos cassinos estavam em lugares maravilhosos como o bairro da Urca no Rio e o Quitandinha, na cidade de Petrópolis. Eram destinos atraentes; tinham uma relação com o show business representados por estrelas como Grande Otelo e Carmem Miranda. Porque ir para um deserto jogar, quando as praias e a infraestrutura da Cidade Maravilhosa chamavam? (1)


Finalmente, o Decreto-Lei nº 204, assinado pelo presidente Humberto Castello Branco, em 1967, estabeleceu o monopólio da União nos serviços de loteria, destacando ser “dever do estado, para salvaguarda da integridade da vida social, impedir o surgimento e proliferação de jogos proibidos que são suscetíveis de atingir a segurança nacional”.

Desta maneira, este tripé de Decretos-Leis oferece sólido suporte para impedir a regulamentação de jogos de apostas em dinheiro, administrados pela iniciativa privada no Brasil. Sem a anulação dos mesmos não será possível construir algo sólido e duradouro para investidores nacionais e estrangeiros. Caso contrário, os mesmos estarão sendo levados para realizar ações empresariais em absoluta insegurança jurídica.

O Brasil faz parte da Organização Mundial de Turismo (OMT), que reúne 156 países dos quais 71,16% regulamentaram os jogos de apostas em dinheiro. Entre os 28,84% de países que não regulamentaram os jogos, 75% são repúblicas islâmicas. Estes números mostram que regimes autoritários fascistas, como o do Chile, no governo Pinochet, e da Argentina, nas ditaduras militares dos anos 1970/1980; e regimes socialistas, como do Vietnã e da China, souberam superar barreiras da época da Guerra Fria e implantar atraente indústria de jogos. Exemplos que poderiam servir de inspiração para os legisladores brasileiros.

Nos Brazilian Gaming Congress, realizados desde 2013 (última versão em 2018), pude verificar o vivo interesse de investidores estrangeiros no mercado de jogos existente do Brasil. Ficam sempre impressionados quando trago a seguinte citação do professor Simão Brayer, inventor da Loteria Esportiva, sobre o Jogo do Bicho:
 

“O Jogo do Bicho possui uma envergadura tal que deveria ser analisado por militares e estrategistas, que aprenderiam de um só golpe, esta extraordinária metodologia. A divulgação boca-a-boca da credibilidade deste sistema aumenta ainda mais o seu peculiar nível de segurança: vale o que está escrito. Com três sorteios diários, o Jogo do Bicho aceita apostas de pequeno valor. A massa de apostadores é atraída pelo baixo custo e pelo imediatismo dos resultados. Além disso, é um jogo especial, porque mexe com uma força invisível, que nasce do inconsciente: o sonho. Para apuração, controle e pagamento dos prêmios foi montada uma sofisticada rede de comunicação (antigamente via telefone e hoje via internet). E, para a comunicação das apostas para os sub centros de triagem e descarga, vem sendo permanentemente acionado um mutirão capitalizado, que funciona de seguinte forma: cada grupo de 10 apontadores, localizados em um raio de um quilômetro, está subordinado a um dono de ponto. O dono do ponto recolhe as apostas e realiza a descarga, que é responsável por 10 donos de pontos. Cem pessoas estão envolvidas nessa primeira fase. A descarga das apostas que excedem o limite de autonomia do dono do ponto é feita no banqueiro de primeira instância, responsável por 10 banqueiros de descarga (1.000 pessoas). Ele, também, informa para o banqueiro de segunda instância o excedente das apostas acima de seu limite. O banqueiro de segunda instância controla 10 banqueiros de primeira instância (10 mil pessoas). Finalmente, cada um dos quatro banqueiros do bicho controla 10 banqueiros de segunda instância. Esta megaempresa na cidade do Rio de Janeiro possui uma estrutura operacional de pirâmide, envolvendo diretamente 40 mil pessoas, perfeitamente coordenadas. Cada uma, na hora certa, sabe o que fazer (2).


Os investidores estrangeiros confirmam que este modelo de organização do Jogo do Bicho, que realiza vinte (20) milhões de apostas diárias e oferece trabalho para um (1) milhão de pessoas no país, é impossível de copiar e levar para aplicação nos EUA, como fizeram com o formato Cassino & Show, criado no Cassino da Urca, na década de 1940, pelo maior empresário brasileiro de jogos e turismo de todos os tempos, Joaquim Rolla. Dizem: “Isso é como uma Guerra de Guerrilha!” O que justifica mais ainda a proposta do intérprete musical Zeca Pagodinho, ex-apontador do Jogo do Bicho, em tombar esta modalidade de jogo como Patrimônio Imaterial Histórico e Cultural do Brasil.

Este Patrimônio Histórico e Cultural, proibido faz 77 anos, ao não ser incorporado às atividades turísticas, termina sendo um desperdício. Ainda mais quando constatamos que é o Jogo do Bicho o principal investidor dos desfiles das escolas de samba do Grupo Especial do Carnaval do Rio de Janeiro. Com certeza é um potencial que merece ser regulamentado.

Como lembra Valéria Lima Guimarães, doutora em História Social, “à época do fechamento dos cassinos brasileiros (1946) havia cerca 60 mil trabalhadores diretos (Paixão, 2005) (3)”. Todos foram demitidos. Com o fechamento dos bingos, em 2007, 330 mil pessoas ficaram desempregadas (4).

Não cabe mais, em tempos de pós-Guerra Fria, continuar a incentivar Guerra de Guerrilha no Brasil. Temos de acatar a opinião do ex-Ministro de Defesa e atual Ministro Extraordinário de Segurança Pública, Raul Jungmann:
 

“Penso que o monopólio do jogo nas mãos do estado é discutível, sem a menor sobra de dúvidas. Repito, não vejo nenhuma relação entre Soberania Nacional e a liberação ou não de jogos. Não estou entrando no mérito. Estou dizendo que isso é algo risível. Isso é uma questão que compete à sociedade debater e discutir com os seus representantes, sem qualquer menção à Soberania ou à Defesa Nacional. Estamos frente a uma questão que deve ser analisada junto à segurança pública. Temos que ter cuidado com desvios, que aliás nem sempre acontecem. Temos, por exemplo, informalmente a presença do Jogo do Bicho, que é tolerado no país inteiro (5)”.


 

*Luiz Carlos Prestes Filho é Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, autor dos livros: “Economia da Cultura – a força da indústria cultural do Rio de Janeiro (2002), “Cadeia Produtiva da Economia da Música” (2005), “Cadeia Produtiva da Economia do Carnaval” (2010), “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2016) e “A Teoria das Probabilidades no Jogo, na Ciência e nas Políticas Públicas” (2017)

 

(1) Trajano Ribeiro, Seminário “Jogos da Fortuna à Luz da Constituição”, Ordem de Advogados do Brasil Rio de Janeiro (OAB/RJ), 27/11/2017

(2) Simão Brayer, pág, 14-15, livro “O Show Tem que Continuar”, Ultra-Set Editora Ltda, Rio de Janeiro, 1995.

(3) Valéria Lima Guimarães, revita “Inteligência Empresarial” nº37, pág. 39, E-Papers, Rio de Janeiro, 2013.

(4) Site do Sindicato dos Metalúrgicos, 31/05/2007, http://metalurgicos.org.br/noticias/forca-sindical-faz-protesto-com-10-mil-trabalhadores-de-bingo-no-centro-de-sp/

(5) Raul Jungmann, livro “A Teoria das Probabilidades no Jogo, na Ciência e nas políticas Públicas”, pág. 20-21, Editora E-Papers, Rio de Janeiro, 2017.