Atualmente, o advogado desportivo Leonardo Andreotti atua como presidente do IBDD, que foi fundado há quase 20 anos, em São Paulo. O Instituto Brasileiro de Direito Desportivo é uma associação sem fins econômicos, apolítica, sem vinculação a qualquer clube ou faculdade e que tem como meta principal o desenvolvimento do estudo do Direito Desportivo Brasileiro. O IBDD pretende estimular o desenvolvimento de pesquisas no âmbito do Direito Desportivo em todos os níveis, bem como promover e intensificar as atividades acadêmicas ligadas ao Direito Desportivo e seus membros.
GMB - Como você vê o boom das apostas esportivas que vive o Brasil hoje? Dá a sensação de que os clubes estão obtendo benefícios importantes a nível de patrocínios?
Leonardo Andreotti - As apostas esportivas já são uma realidade. É uma área que está ali, pronta pra ser evoluída e aplicada, mas depende de regulamentação por decreto. Esse "boom" é um potencial ainda. Precisamos ver na prática como o mercado vai reagir a essa regulamentação. A princípio, trata-se de uma receita interessante pro esporte, principalmente considerando que a legislação vai trazer benefícios em termos de formalidade, inclusive para o Estado através dos tributos. Apesar de ter relação com o patrocínio esportivo, ela não é propriamente uma relação intrínseca. Claro que o investimento nessa área vai acabar sofrendo, positivamente, um impacto bastante relevante a medida que investidores serão atraídos.
Gostaria de ser chamado pelo Governo para opinar ou dar alguma sugestão desde o ponto de vista da sua área de direito desportivo? Quais pontos-chave deveriam ter em conta para a elaboração da melhor regulamentação?
Um diálogo é sempre muito produtivo. Se todos os atores pudessem ser ouvidos, teríamos certamente uma regulamentação mais apropriada e condizente com a realidade e as especificidades de cada setor. As apostas esportivas influenciam em muitas áreas do direito desportivo, sobretudo no que se refere à disciplina esportiva. Com as apostas, naturalmente vem também os potenciais riscos para o equilíbrio da competição através de eventuais manipulações de resultados. Como isso vai ser visto? Como teremos um rigor melhor na legislação para punir aqueles que manipulam os resultados? São exemplos que demonstram a importância dos atores do esporte e do direito serem ouvidos, principalmente, os protagonistas do direito desportivo.
Com frequência aparecem casos de partidas combinadas ou alerta de suspeitas. Qual seria o melhor sistema de detecção para combater este problema no Brasil? Nas mãos de quem deve ficar a defesa da integridade e punição?
Existem empresas com medidores que verificam anormalidades nas partidas. Essas anormalidades trazem como consequência a necessidade de uma investigação. Na prática, conseguem analisar se houve ou não violação das regras.
Já em relação a quem deve ser o responsável pela defesa da integridade e punição, vai ter situação que a justiça esportiva vai ter competência para apreciar e dar uma resolução final quando essa manipulação afeta a esfera disciplinar desportiva. Entendendo o futebol como um fenômeno econômico, de relevância para a nação e de interesse público, evidentemente, que a Segurança, o Poder e o Ministério Públicos, além do Poder Judiciário, precisam agir sobre esse viés para evitar e punir todo e qualquer modo de manipulação dos resultados.
Você que já trabalhou como árbitro no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem vê a necessidade da implantação de departamentos específicos para a integridade no esporte? De que forma acredita que a regulamentação das apostas esportivas pode incentivar na fiscalização e na criação das áreas destinadas para isso dentro dos clubes nacionais?
Acho imprescindível que mecanismos de regulamentações, prevenções ou punições no que se referente à integridade do esporte são extremamente importantes. O bem jurídico maior a ser protegido nesse caso é a competição, e ela só é o que é por conta da incerteza de seus resultados. Isso que traz o interesse do público e dos investidores, e é daí que vem a receita para a manutenção do próprio sistema. Então prevenir e proteger a integridade do esporte é, talvez, a forma mais importante e eficaz de manter a atividade esportiva como uma atividade econômica que é também. A governança, o compliance, a proteção de dados e outros departamentos específicos que visam controlar e proteger a integridade do esporte são extremamente importantes.
Foi editada a MP 984/20, que determina que os direitos de transmissão ou reprodução das partidas esportivas pertencem ao clube mandante do jogo. A medida altera a Lei Pelé, assim os times que ainda não cederam seus direitos poderiam usar suas plataformas da internet para transmitir suas partidas do local ou, inclusive, vendê-los aos sites de apostas esportivas interessados. Qual o seu ponto de vista em relação a essa alteração?
Atos jurídicos perfeitos devem ser preservados e é fato que se essa alteração for confirmada no processo legislativo, certamente outros métodos de captação de imagem, transmissão e, consequentemente, comercialização e exploração do esporte serão implementados e executados. O streaming vem sendo uma ferramenta muito inovadora já há uns três ou quatro anos. Essa MP parece que veio para dar um empurrão numa evolução que é inevitável.
O futebol brasileiro tem chamado muito a atenção das casas de apostas, que têm patrocinado vários times da Série A do Brasileirão. O vôlei é o segundo esporte mais popular no Brasil, mas essa indústria parece ainda não ter visto o poder dessa atividade. Como os times de vôlei podem atrair esses investidores que têm estampado muitos uniformes do futebol daqui?
Diria que isso vale não apenas para as apostas, mas qualquer outra forma de receita para a confederação. As entidades precisam se organizar para que possam fazer o investidor entender que aquela modalidade tem uma plataforma importante em termos de comunicação, de exploração positiva da imagem daquele que patrocina. O esporte brasileiro precisa ser valorizado e reinventado para ser visto como uma plataforma de destaque de ativação de marcas. O mercado dá o tom e as entidades precisam entender qual é a necessidade e qual é a carência para evoluir no ponto de vista interno. Isso vai fazer com que outras receitas venham e ajudem no desenvolvimento da modalidade. A título de exemplo, cada vez mais as confederações estão preocupadas com a governança interna, o equilíbrio da competição, com a preservação, etc. Tudo isso vai gerar um interesse cada vez maior do investidor nessa entidade.
Acredita que a liberação e regulamentação de vários tipos de jogos (como cassinos, bingos, etc) podem injetar mais investimento nos clubes brasileiros, assim como as casas de apostas têm feito de forma massiva?
Com essa regulamentação, muito recurso vai circular. Quando há circulação de recursos claro que, naturalmente, existe uma chance muito grande que essa renda passe pelos clubes e pelos atores do esporte brasileiro. Os times, as entidades de administração e os atletas se ressentem, ultimamente, da falta de recursos. Com essa movimentação financeira, evidentemente, haverá receitas e que elas possam ser melhor exploradas no âmbito dessas entidades.
Fonte: Exclusivo GMB