MIÉ 24 DE ABRIL DE 2024 - 20:33hs.
Luiz Carlos Prestes Filho, Diretor do jornal Tribuna da Imprensa Livre

Quem defende a exclusiva presença do Estado no Jogo é antiliberal, estatizante e monopolista

Entre os meses de fevereiro e março deste ano publiquei 30 matérias sobre a necessidade da regulamentação dos jogos administrados pela iniciativa privada no Brasil: cassinos, bingos e jogo do bicho. Deputados federais e estaduais, vereadores e empresários, engenheiros e artistas, advogados e tributaristas debateram um tema que recentemente seria difícil emplacar abertamente na mídia. Ampliamos as fronteiras do debate, antigos defensores da causa conheceram novos atores, temas do passado foram revisitados e os novos foram apresentados.

Infelizmente, por razões óbvias, não pude dar a palavra para os responsáveis por jogos clandestinos no Brasil. Pessoas que vivem à margem da lei por conta do entulho autoritário que ainda rege o país criado pela ditadura do Estado Novo (1937/1945) e fortalecido pela Ditadura Militar (1964/1989). Dispositivos legais que desempregaram milhares de trabalhadores dos cassinos brasileiros, em 1946; outros milhares em 2007, quando fecharam os bingos, que tinham sido autorizados pelas leis Pelé e Zico; e que mantêm há 120 anos milhares de apontadores do jogo do bicho na ilegalidade.

Realizei as matérias durante a pandemia da COVID 19, enfrentando a TV Globo que lançou um filme tendencioso e covarde sobre o histórico bicheiro Castor de Andrade. Grande incentivador do carnaval brasileiro, amigo dos patronos Anísio Abrão David, GRES Beija-Flor de Nilópolis, e Ailton Guimarães Jorge, GRES Vila Isabel, a quem os realizadores não deram voz. Produto audiovisual inventado para criar pânico e um ambiente contrário a todos patronos das escolas de samba do Rio de Janeiro. 

Ficou bem evidente este direcionamento editorial após a publicação da matéria do repórter Chico Otavio, do jornal O Globo, com o título: “Novos chefes do bicho apostam em aliança com milícia”, em 21/02/2021. Na qual, sem nenhuma prova envolve instituições e pessoas com o crime organizado. Na matéria somente alegações.

No ano de 2018, o mesmo jornal O Globo publicou o editorial “O Melhor é Legalizar o Jogo para Regulá-lo”. Um texto oficial favorável à regulamentação dos jogos no Brasil. No qual reconhece que foi um erro as Organizações Globo, ao longo de décadas, serem contrárias à livre decisão de um cidadão, de um país onde vigora a democracia – sistema político universal que está acima das religiões e ideologias – em jogar ou não jogar: “O tempo passou, o jogo explorado em cassinos caiu na clandestinidade, e assim tem sido até hoje. Este jornal (O Globo) apoiou o presidente Dutra naquela decisão, e sempre foi crítico da possibilidade de sua volta, devido ao aspecto do vício e do risco de se constituir mais uma brecha a ser explorada pelo crime organizado, em especial para lavagem de dinheiro. 

Os mesmos motivos que levaram Dutra a baixar o decreto de 1946. Nesses 72 anos, porém, o avanço da tecnologia digital tornou inócua uma proibição formal que não consegue impedir que o jogo seja feito de forma eletrônica, fora do alcance do Estado brasileiro. É o suficiente instalar servidores em países em que há um tratamento tributário amigável para cassinos e de lá receber apostas dos brasileiros”. Será que o repórter investigativo do O Globo, Chico Otavio, não investiga os editoriais do jornal onde trabalha? Pelos artigos que escreve, desde 2018, contrário à regulamentação de jogos deduzo que não!

Porque será que Chico Otavio não denuncia, com a mesma coragem que denuncia cassinos, bingos e o jogo do bicho, como estruturas de lavagem de dinheiro e do crime, o sistema bancário nacional e internacional. De acordo com o ministro russo, Viktor Ivanov, que comanda uma estrutura poderosa para o combate à lavagem de dinheiro no mundo: “Os fabricantes de droga ficam só com 5% do lucro. Os responsáveis pelo transporte, com 30% ou 40%. O resto vai para o crime organizado, que lava o dinheiro. E não há dúvidas que o sistema bancário mundial é um dos grandes beneficiados. Na falta de liquidez crônica que vemos hoje em dia, os bancos precisam de recursos para gerar crédito, e a tolerância é grande. Em russo, dizemos: para os bancos, dinheiro não tem cheiro”. A constatação acima, desta importante autoridade russa é interessante porque em seus relatórios não existem denuncias contra cassinos, bingos ou jogo do bicho. Os bancos que lavam dinheiro!

A entrevista com o ministro Viktor Ivanov foi publicada no “O Globo”, mas, pelo visto, o repórter Chico Otavio, além de não ler os editoriais, não lê as matérias publicadas no jornal onde trabalha. Desejo que ele tenha lido a seguinte nota na coluna do Ancelmo Góis, em 04/03/2021: “Os presidente da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, reuniram-se com CEOs das 50 maiores empresas do país, no último dia 1º. Os dois disseram que uma das pautas prioritárias para aprovação é a liberação dos cassinos no Brasil.”

 

 

Dedico uma especial atenção a estas contradições acima porque, como disse o coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa da criação do Marco Regulatório dos Jogos no Brasil, João Carlos Bacelar: “Há, hoje, uma minoria que defende uma lei que é chamada na Câmara de ‘Lei Sheldon Adelson‘ (em homenagem ao empresário americano, recentemente falecido), que só permite a legalização de Cassinos Integrados a Resorts. Nós somos terminantemente contra isso. Tenho percebido que a movimentação, no Congresso, é regulamentar apenas três cassinos e entregar o monopólio do jogo no Brasil para investidores dos Estados Unidos. Querem empurrar o mercado não regulado para estruturas criminosas, o que seria um absurdo.” Para o deputado: “É inaceitável abrir as portas do Brasil para empresários internacionais sem legalizar o empresário brasileiro, que está aí como contraventor.”

Na opinião do jornalista Gildo Mazza, do portal de notícias Games Magazine Brasil, lamentavelmente os jornais “Folha de São Paulo”, “O Estado de São Paulo” e a revista “Veja” ainda preservam o ranço dos tempos de 1946, quando, por decreto foram fechados os cassinos no Brasil: “São veículos de comunicação que abertamente mantêm um posicionamento antiliberal, estatizante e centralizador. Desejam que o Estado brasileiro continue com o monopólio tutelando o cidadão. Podemos ir ao cinema, teatro e ao museu mas não podemos jogar. Para uma imprensa que se diz livre isso é pernicioso. Nas televisões temos que a somente a Rede Bandeirantes à favor da regulamentação. Inclusive, dando cobertura para seminários e congressos sobre o tema.”

Hoje, com a mídia social e as publicações eletrônicas, surgiu uma rede com noticiário mas amplo a respeito da regulamentação dos jogos, destaca Gildo Mazza: “Por conta da promulgação da Lei das Apostas Esportivas, nº13.756, em 2018, no governo Michel Temer, o setor foi incrementado. Apesar de ainda não está regulamentada foi um avanço e a imprensa não pode esconder este fato. Tanto que tenho a certeza de que, caso o jogo seja regulamentado, os mesmos jornais e revistas, redes de TV e e de rádio, que hoje são contra vão criar cadernos especiais sobre o tema com visão positiva. Vão querer faturar. Até porque o movimento financeiro já é uma realidade. Por exemplo, mais da metade dos times das séria “A” e “B” do Campeonato Brasileiro de Futebol tem patrocínios de casas de apostas esportivas.”

O jornalista do portal de notícias Games Magazine Brasil lembra também que: “Os grandes veículos de comunicação no mundo inteiro participam direta e indiretamente das estruturas empresariais montadas para apostas voltadas para o esporte e a cultura. O melhor exemplo é o Cassino MGM Resorts. Muitos empresários da comunicação do Brasil já perceberam que, ao não ter estruturas similares no Brasil, estão perdendo milhões e milhões dólares. Assim como perderam milhões durante os Jogos Olímpicos (2016) e a Copa do Mundo de Futebol (2014).”

Termino a publicação dessa série de matérias dedicadas a regulamentação de jogos administrados pela iniciativa privada, com o sentimento de missão cumprida. Ampliamos as fronteiras do debate, antigos defensores da causa conheceram novos atores, temas do passado foram revisitados e os novos foram apresentados.

Vamos torcer para que os atuais e os futuros editores do “O Globo”, “Folha de São Paulo”, “O Estadão”, revista “Veja”, TV Globo, TV Record, Rede TV e SBT, entre outros importantes veículos da imprensa brasileira, consigam abordar o tema dando voz a todos atores do setor democraticamente. Desejo que os jornalistas e editores brasileiros consigam ter um sono tranquilo. Que não vivam o terror do jornalista Chico Otavio do “O Globo” que deve interromper o sono, acordar toda madrugada, para ver se não tem um bicheiro ou um crupiê debaixo da cama.
 

LUIZ CARLOS PRESTES FILHO
Diretor Executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Cineasta, formado em Direção de Filmes Documentários para Televisão e Cinema pelo Instituto Estatal de Cinema da União Soviética; Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local; Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009); É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).